Folha de S. Paulo


Israel pensou ter aval de Trump, mas Casa Branca prepara contenção

Donald Trump, na ânsia por desempenhar o papel de anti-Obama, distribuiu na campanha promessas a cântaros e, no labirinto do Oriente Médio, disparou propostas sedutoras para o premiê israelense, Binyamin Netanyahu.

No entanto, a Casa Branca, após pressão saudita e jordaniana, faz desbotar o cheque em branco sonhado pelo governo de Israel.

Mussa Qawasma - 24.fev.2017/Reuters
Palestino atira sapato contra um pôster do presidente dos EUA, Donald Trump, em Hebron
Palestino atira sapato contra um pôster do presidente dos EUA, Donald Trump, em Hebron

Ao falar em mudar a embaixada norte-americana de Tel Aviv para Jerusalém e indicar para embaixador em Israel um defensor de assentamentos na Cisjordânia, Trump entusiasmou integrantes do gabinete direitista israelense e alimentou preocupação em países árabes, sobretudo nas monarquias sunitas.

Coube ao rei Abdullah, da Jordânia, o papel de mensageiro. Arrancou no começo do mês encontro com o presidente americano e desenhou linhas vermelhas para auxiliar a modelar um vetor em nascimento: a visão política de Donald Trump para o Oriente Médio.

O empresário-apresentador transformado em presidente jamais demonstrou conhecimento sofisticado sobre a região. Percebeu agora não poder apenas percorrer a linha de desconstrução de abordagens de Barack Obama.

Após a iniciativa jordaniana, surgiram sinais de recuo. A Casa Branca, ainda numa mudança em relação ao governo democrata, rejeitou o rótulo de "obstáculos para paz" aos assentamentos na Cisjordânia.

No entanto, logo em seguida, sustentou que sua construção e expansão "poderiam ser prejudiciais à busca pela paz".

A reorientação prosseguiu na recente visita de Netanyahu à Casa Branca. Trump declarou aceitar a ideia de um Estado para israelenses e palestinos, desde que fosse "resultado de negociação entre as partes". Grupos direitistas em Israel comemoraram a admissão, por um presidente americano, do cenário de apenas um Estado entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo.

No entanto, Trump mencionou também a solução de dois Estados e pediu ainda para Netanyahu "segurar" a expansão de assentamentos. Repetiu a palavra "acordo" várias vezes. "E poderá ser um acordo maior e melhor do que algumas pessoas nesta sala compreendem", acrescentou.

Trump tenta se equilibrar entre compromissos políticos e ideológicos com a direita israelense e interesses estratégicos e econômicos com as monarquias árabes lideradas pelos sauditas.

A Casa Branca, portanto, sinaliza uma negociação apoiada no binômio Israel-Arábia Saudita que, sem relações diplomáticas, já dialogam por canais informais.

Israelenses e sauditas se aproximam por enxergarem no Irã, potência regional xiita, o inimigo comum. O presidente americano também descreve o regime iraniano como principal fator de desestabilização no Oriente Médio.

Trump sugere enveredar pela busca de um acordo amplo, entre seus aliados árabes e Israel, contemplando um eventual Estado palestino. O caminho é árduo, e ele carece da liderança necessária para implementar o processo.

Mas a sinalização da Casa Branca reforça a ideia de que, no fim das contas, a única alternativa para o conflito no Oriente Médio consiste na solução de dois Estados para dois povos, com segurança e viabilidade garantidas para israelenses e palestinos.


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