Folha de S. Paulo


Agulha na carne

Durante muito tempo, vi a acupuntura com ceticismo. Leigo, não conseguia entender como aquelas lancetadas poderiam ajudar o paciente. Comecei a mudar de percepção quando me mudei para Pequim, nos anos 1990, para trabalhar como correspondente da Folha.

Virei campo de provas de um amigo espanhol estudante de medicina chinesa. As agulhas passaram a me auxiliar em diversas situações. Contribuí para a formação de mais um acupunturista vindo de plagas ocidentais.

De volta ao Brasil, afastei-me um pouco das práticas chinesas, talvez por desconhecer o caminho das pedras em minha terra natal. Mas retornei ao mundo das agulhas quando meus samoiedas, raça de origem siberiana, começaram a enfrentar o envelhecimento e o agravamento das consequências da displasia coxofemoral.

Ilustração Tiago Elcerdo

Descobri o problema quando Vássia, o pai da matilha, passou a gemer no momento de se levantar. Radiografei-o, assim como os outros cinco siberianos da família.

Em graus diferentes, todos apresentavam o problema responsável por dores e alterações em articulações.

Trata-se de uma doença hereditária, que pode ser agravada por problemas ambientais. Como nunca fui um criador profissional, decidi apressar as castrações. Não queria que o gene se perpetuasse.

Medicamentos à base de condroitina, um componente das cartilagens, entraram em minha rotina de cachorreiro. Também passei a controlar peso dos animais com mais rigor, para evitar esforços ampliados para a estrutura óssea. Pisos lisos entraram numa lista de proibições.

Os esforços se coroaram com sessões de acupuntura. Impressionante o resultado. Os cães respondem com velocidade meteórica à aplicação, liberando-se da dor e voltando a esbanjar energia. E quando acabar de escrever este texto, vou receber a veterinária para cuidar do Hooper. O meu único samoieda de hoje em dia, fruto de adoção, não escapou ao gene da displasia.


Endereço da página: