Folha de S. Paulo


Apesar de iniciativas, elite continua querendo governar por procuração

Pedro Ladeira - 4.nov.2013/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 04-11-2013, 19h30: Prédio do Congresso Nacional é iluminado de azul, como parte da campanha Novembro Azul, que chama atenção para a prevenção do câncer de próstata. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
Vista frontal do prédio do Congresso Nacional, sede do Poder Legislativo, em Brasília

Uma das diversas belezas do sistema político britânico é a exigibilidade do voto para aqueles que querem ter alta função pública. Se o sujeito quer ser secretário do gabinete, o equivalente aos nossos ministros, ele precisa ter sido eleito membro do Parlamento.

Claro, essa é uma condição básica do parlamentarismo; de outra forma, estaríamos falando de jabuticabas como o semipresidencialismo informal em vigor sob Michel Temer ou aquele mais estruturado ora em debate nos corredores de Brasília.

Seja como for, o argumento intuitivo dirá que isso exclui do topo do serviço público os supostos melhores de cada área. Os "Pelés e Jatenes" do primeiro ministério de FHC, ainda que a realidade tenha sido meio cruel nesses casos específicos.

Creio que o contrário é muito mais válido: exigir voto traria, no médio e longo prazos, estratos da elite econômica e intelectual do país para dentro do sistema político. Coibiria voluntarismos.

No Brasil, elite sempre agiu por procuração. Em 1964, deixaram os militares soltos e deu no que deu. Desde a redemocratização, o processo foi sequestrado por meia dúzia de empreiteiras e uns poucos bancos, que devido a regras lenientes elegiam suas bancadas e candidatos majoritários.

Nada contra financiamento privado: sua proibição destampou uma caixa de Pandora. Faltavam regras transparentes, o que levou ao paroxismo do petrolão, estimulado pela sede do PT de manter um condomínio de poder. Não deixa de ser irônico que Lula tenha sido um dos mais perfeitos representantes da elite que tanto combate no palanque.

Mas a constante é a ausência de responsabilidade das elites. Aqui e ali surgiram, sob as asas de fundações de bancos ou grandes empresas, iniciativas, usualmente setoriais -educação, sustentabilidade e outras bandeiras "do bem".

Algo mais orgânico, começando pela incubadora de start-ups políticas Raps, emergiu nesta década e desaguou nos movimentos que ganharam destaque no noticiário: Agora!, Acredito, Nova Democracia, RenovaBR etc.

Recentemente, o modelo foi posto a teste com a candidatura de Luciano Huck à Presidência, que, à moda da viúva Porcina, foi sem nunca ter sido. O que não quer dizer que não possa vir a sê-lo, mas essa é outra história.

Huck aproximou-se do Agora!, que por sua vez percebeu o óbvio: sem estrutura partidária, logo voto, não se vai a lugar algum no Brasil. Buscaram alguma sigla mais anódina para servir de hospedeira, e acharam o PPS: vejamos como se saem ano que vem, agora que provavelmente não terão seu puxador de votos.

Antes disso houve o Partido Novo, sigla de banqueiro que atraiu uma tucanada endinheirada, que se considera genial e não tem voto. A ideia está longe de ser ruim: nomes técnicos dentro de uma estrutura formal. O PSDB já sonhou em ser isso e, em alguns de seus momentos, conseguiu -só para acordar ao lado do PMDB, PFL e afins.

Ainda antes, havia a Rede de Marina Silva. Ela fracassou em montar seu partido, confundindo "likes" com filiações, a tempo de disputar em 2014. Teve de abrigar-se no PSB. Agora tem sigla e quer ser candidata, mas a desconfiança sobre sua permanente abulia política talvez tenha chegado a níveis críticos.

As elites seguem de fora, procurando nomes para chamar de seus. Ao fim, pode até ser tristemente melhor, bastando ver onde a Itália foi parar quando sua sociedade civil resolveu lidar com as coisas usando um dos seus, um certo Silvio Berlusconi.


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