Folha de S. Paulo


O Oriente Médio pós-Obama

A Era do presidente Barack Obama está chegando ao fim. Renitentes questionamentos emergem sobre os alicerces de seu legado para o Oriente Médio e, ainda, trazem incertezas sobre o futuro da região no governo de Donald Trump.

Na visão dos conservadores, o legado de Obama não poderia ter sido pior. Para esse grupo, os EUA libertaram o Irã do seu isolamento internacional com a assinatura do acordo nuclear, distanciaram-se de Israel, relegaram tradicionais aliados do Golfo, descumpriram as promessas das "linhas vermelhas" para a Síria e permitiram que a Rússia expandisse o seu poder na região.

Impulsionados por um prisma geopolítico diferente, os guardiões da política externa obamista utilizam como contra-argumento a extração das armas de destruição em massa da Síria, a política de sanções que forçou o Irã a renunciar ao seu programa nuclear para fins militares, a proteção de Israel a despeito da expansão dos assentamentos ilegais na Cisjordânia e o combate a mais letífera organização terrorista surgida no pós-11/9, o Estado Islâmico.

A persuasão diplomática e o pragmatismo, vetores escolhidos por Obama, acabaram se sobrepondo ao emprego da força na reconfiguração da arquitetura de segurança coletiva da região –salvo a desastrosa intervenção militar na Líbia.

Os falcões republicanos sublinham que o poder de dissuasão dos EUA na região sofreu fissuras e, consequentemente, o país viu reduzida sua capacidade de moldar os contornos geopolíticos do Oriente Médio. No fundo, encontram-se justapostas duas visões contraditórias de como o poder americano deveria ter sido empregado na região, especialmente após a eclosão da Primavera Árabe.

Até o momento, as escolhas de Trump para postos-chave em áreas conexas à defesa, inteligência e segurança indicam que sua política exterior para o Oriente Médio será distinta da de seu antecessor.

Nesse sentido, os riscos que o mundo e o Oriente Médio poderão enfrentar começam pela promessa do rompimento do acordo nuclear com o Irã. Os efeitos dessa escolha não só minariam a crença no regime de não proliferação nuclear como estimulariam corrida armamentista na região de consequências imprevisíveis.

A opção de Washington pela escalada unilateral contra Teerã criaria sérios distúrbios entre europeus e americanos em virtude dos contratos bilionários firmados entre empresas europeias e o governo iraniano logo após o acordo nuclear.

Além disso, o governo Trump terá de lidar com o fortalecimento da aliança denominada de "Eixo da Resistência". Essa coalização está cada vez mais integrada estrategicamente e com um real poder de influência nos principais temas regionais em locais como Iraque, Síria, Iêmen, Líbano, Bahrein e Palestina.

Outros problemas que Washington terá de encarar são o papel pendular do Egito entre EUA e Rússia, o franco duelo entre a Arábia Saudita e o Irã, a ascensão do nacionalismo curdo e os riscos securitários que Israel enfrentará na região.

A administração Trump encontrará uma região instável e mais sensível do que antes ao emprego da força, e onde retaliações e ameaças não possuem mais tanto efeito assim.

O velho método intervencionista das doutrinas de defesa e diplomacia dos EUA pode não funcionar num Oriente Médio onde a velha ordem está em fase final de desintegração. Obama, ao fim, compreendeu isso.


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