Folha de S. Paulo


Uma política externa vigorosa

O Brasil precisa discutir com urgência as diretrizes estratégicas de uma nova política externa. É o momento de fazer profunda reflexão sobre as nossas opções no tabuleiro mundial e definir a matriz de ideias que irá reger as escolhas da nação.

O atual modelo dá claros sinais de exaustão. O processo de formulação não consegue mais detectar prioridades, apontar rumos, abrir frentes de engajamento nem inovar na prospecção de oportunidades.

O país segue atrelado a percepções puídas e a objetivos inócuos e contraditórios. A perda de vigor externo se evidencia no circulo vicioso em que a diplomacia brasileira caiu ao apenas gerir e não prover soluções estratégicas de longo prazo.

Para começar, há um composto de projetos que deverão ser revistos, como o Ibas (Índia, Brasil e África do Sul) e o G4 (o grupo de países que pleiteia assento permanente no Conselho de Segurança da ONU —Alemanha, Brasil, Índia e Japão).

O primeiro se sobrepõe a outras agendas. O último é um projeto fadado à morte, já que Alemanha opera mais fora do G4 e a China não quer Japão e Índia no clube dos cinco do Conselho de Segurança.

No plano bilateral, o Brasil poderia extrair mais a partir de uma plataforma de inserção mais sistêmica na Ásia no campo comercial. É preciso resgatar a parceria com o Japão e ir além das atuais relações com Pequim e Nova Déli. O Brasil deveria olhar, ainda, para o potencial de Coreia do Sul, Malásia, Cingapura, Vietnã, Irã e Paquistão.

No Oriente Médio, o Brasil frustrou a expectativa nos últimos anos.

Uma paulatina retração sucedeu ao período de ativismo diplomático, que catapultou brevemente as relações comerciais com o mundo árabe. Mas a ausência da mandatária brasileira na Cúpula América do Sul-Países Árabes, realizada no fim do ano passado, na Arábia Saudita, marcou o notável descompasso entre o discurso e a realidade.

Patrono da iniciativa lançada em 2005 sob o governo Lula, o Brasil se fez representar em nível ministerial. A retórica da cooperação Sul-Sul desintegrou-se em Riad, no evento dos dez anos desse fórum de 34 países.

Em termos geoestratégicos, a América do Sul seguirá como prioridade natural. É preciso, contudo, redefinir o escopo dessa prioridade e estimar o gasto de energia com projetos como Mercosul e Unasul.

O Brasil precisa evitar se envolver em iniciativas opacas que terminem em bulas genéricas de palavrório diplomático requentado. Um país do peso do Brasil não pode ter sua influência política e econômica diluída em fóruns anacrônicos.

No contexto hemisférico, comércio, defesa e segurança devem ser os pilares na relação bilateral com os EUA. Enquanto o Brasil não for capaz de causar reflexão em Washington sobre suas escolhas estratégicas, será difícil obter do establishment americano maior sofisticação no trato com Brasília.

Uma política externa focada na qualificação do desenvolvimento nacional requer persistente e ativa política comercial, industrial e científico-tecnológica, além de retrabalhar a função da defesa e da inteligência para auxiliar a formulação e execução dos objetivos do país.

Isso significa delinear prioridades, criar uma matriz de planejamento estratégico de longo prazo com riscos e contra-riscos, alocar recursos e, por fim, definir quem seriam nossos principais aliados e adversários no cenário internacional.


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