Folha de S. Paulo


A batalha de Nova York

As prévias desta terça (19), em Nova York, reservam um misto de incerteza e surpresa para os aspirantes a inquilinos da Casa Branca. Republicanos e democratas vivem dias decisivos que podem estancar a desaceleração de Donald Trump e fissurar o favoritismo de Hillary Clinton.

No coração econômico e financeiro da maior potência mundial, as narrativas dos opostos desafiam as mais remotas partículas da racionalidade política. Mas, como política é a arte da promessa e não necessariamente do compromisso, cabe no emaranhado das prévias presidenciais todo tipo de verborragia.

Dentre os 17 postulantes republicanos que se lançaram, Trump venceu mais barreiras do que todos os seus concorrentes e lidera a disputa republicana com uma folga relativa. A sua campanha traçou três estratégias distintas para cada fase da disputa eleitoral o que, em certa medida, tem surtido resultado.

Carlo Allegri/Reuters
O pré-candidato republicano Donald Trump durante evento de campanha em Nova York, em 12 de abril
O pré-candidato republicano Donald Trump durante evento de campanha em Nova York, em 12 de abril

Na primeira, seu discurso pautou-se por galvanizar o voto do cidadão americano de classe média baixa, branco, de baixo nível de escolaridade, suscetível a narrativas anti-imigrantes e à oratória nacionalista e que aspira a evoluir de classe social. Muitos, nessa faixa, projetam-se na figura de Trump, o magnata valentão, bem-sucedido e produto do sonho americano.

Na segunda fase, consolidado como candidato viável e não mais uma anedota de bastidores, Trump centrou fogo na população muçulmana ao rotulá-la como risco iminente aos valores americanos e apresentou-se como fonte de emprego qualificado, oportunidades empresariais e ascensão econômica.

Esse tipo de discurso ganhou aderência na classe média das grandes cidades, de tacanha estatura cultural, ambiciosa e de fácil cooptação por meio do discurso da riqueza.

A terceira etapa é a que mais exigirá do Trump, se ele passar das prévias do partido republicano. Nessa fase, o seu discurso tende a oscilar entre um populismo pautado pela promessa de prosperidade e a retórica nacionalista, centrada no axioma da segurança interna dos EUA contra ameaças externas, especialmente de Rússia, China e do islã.

É importante notar que em nenhuma das duas fases anteriores Trump se viu exigido de forma sofisticada sobre o papel dos EUA no mundo ou quais propostas deveria apresentar quanto aos desafios macroglobais dos quais depende a hegemonia dos EUA no sistema internacional.

Mesmo sendo rotulado de escória humana e de lunático xenófobo, Trump tem demonstrado ter estratégia para avançar —até porque ninguém acumula bens estimados em bilhões de dólares sendo um idiota.

Enquanto a democrata Hillary Clinton e seu rival republicano Ted Cruz se apresentam como produto da elite do establishment e guardiães do mainstream político de Washington, ambos têm mais a perder apenas por terem mais flancos a defender do que seus adversários.

Entre propostas polêmicas e marcante antagonismo, as prévias de Nova York podem se converter no cemitério de algumas candidaturas.

Trump e o senador democrata Bernie Sanders chegam à disputa como franco-atiradores, tendo de provar menos às grande corporações e ao sistema financeiro do que seus respectivos oponentes.


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