Folha de S. Paulo


Paixão com juros

A coluna de domingo passado (24) sobre a independência do Banco Central despertou reações extremadas.

Um grupo se posicionou contra a alta dos juros e defendeu apaixonadamente a manutenção da taxa básica ou sua diminuição. Outro grupo defendeu posição oposta: demandou posição a favor do aumento dos juros, argumentando que foi erro gravíssimo não fazê-lo neste momento.

A leitura das mensagens dos dois grupos revela claros alinhamentos políticos. Os que defendiam a alta da taxa reclamavam por não haver críticas ao PT no texto. Já os que defendiam sua manutenção criticavam a "turma dos juros altos".

Houve também parcela expressiva de leitores que respondeu de forma precisa à mensagem central do artigo, sobre as vantagens de um BC independente e o caráter técnico de suas decisões. Mas as reações extremadas comprovam a alta politização da discussão sobre juros no Brasil. A dominância do viés político nas visões sobre a política monetária é um despropósito, mas mostra a necessidade da discussão do tema e a pertinência da independência.

Esse viés político e apaixonado é prejudicial à compreensão de um assunto técnico e nada apaixonante: a definição da taxa de juros mais adequada a cada momento da economia.

Uma das questões que precisam ser bem entendidas é o real significado da independência do BC. Ela se restringe basicamente à fixação dos mandatos dos diretores e do presidente do banco (que passam a não poder mais serem demitidos pelo presidente da República) e à sua liberdade de usar os instrumentos de política monetária para alcançar a meta de inflação.

A independência do BC, portanto, está a serviço da meta da inflação, que não é definida pelo banco, mas pelo Executivo. Cabe ao BC simplesmente cumprir a meta ou dar explicações à sociedade caso não tenha êxito. Além disso, é o presidente da Republica eleito que indica os diretores e o presidente do BC para serem aprovados pelo Senado.

Um dos grandes ganhos do país na década passada foi reconhecer o valor da inflação baixa e controlada, que beneficia todos os setores sociais, principalmente os de menor renda. Portanto é muito importante que o debate sobre a atuação do BC seja aprofundado para que a política monetária volte ao devido lugar.

Estudos abrangentes mostram que países com Banco Central independente têm inflação controlada e juros menores que países com BCs não independentes.

Quanto maior a percepção de que as decisões para se atingir a meta de inflação são técnicas e baseadas em modelos testados, maior a probabilidade de manter as expectativas e a inflação na meta com a menor taxa de juros possível.


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