Folha de S. Paulo


Pacote marqueteiro

Ricardo Borges - 27.jul.2015/Folhapress
O procurador Deltan Dallagnol, da força-tarefa da Lava Jato, fala em igreja sobre projeto anti-corrupção
O procurador Deltan Dallagnol, da força-tarefa da Lava Jato, fala em igreja sobre projeto anticorrupção

SÃO PAULO - Como prometido, volto a comentar as famosas dez propostas do Ministério Público contra a corrupção. A primeira observação, perdoem-me os procuradores, é que o pacote não passaria numa análise do Procon. Dez é um dos poucos números que não encontrei nas medidas, que se tornaram um projeto de lei de iniciativa popular, amparado em 2 milhões de assinaturas.

O conjunto é composto por 20 projetos legislativos, que trazem, no total, 67 artigos, que, se fossem todos aprovados, resultariam em mais de uma centena de alterações normativas. Minha impressão é que o "dez" entrou mais por exigências do marketing do que da boa classificação.

Como é inevitável numa proposta dessa magnitude, há desde ideias realmente importantes até delírios liberticidas, passando por um bom número de sugestões mais anódinas.

Do lado positivo, eu destacaria a PEC que autoriza o cumprimento da pena após a confirmação da sentença em segunda instância. Isso é fundamental para tornar a Justiça brasileira mais célere e reduzir os recursos protelatórios. É o padrão seguido na maioria dos países democráticos. A exceção são os EUA, onde a sentença pode ter eficácia já a partir do primeiro grau. Também gosto do mecanismo que estabelece prazo para os pedidos de vista de juízes. Eles não poderiam mais se sentar por anos sobre processos paradigmáticos.

Do lado negativo, há vários dispositivos que ampliam desmedidamente o poder do Estado. Não precisamos de novas hipóteses de prisão preventiva, nem de limitações ao "habeas corpus". É verdade que nossa legislação facilita demais a invalidação de provas, mas daí a pretender, como querem os procuradores, que provas ilícitas obtidas "de boa fé" sejam aceitas me parece demais.

O fato é que não faz sentido tratar esse colosso de mudanças como um pacote uno que deve ser aceito ou rejeitado pelos parlamentares. É preciso discutir cada tópico em detalhe.


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