Folha de S. Paulo


Na trilha do crime

O caso do garoto de dez anos morto pela polícia é duplamente chocante: pelo desfecho violento e pela tenra idade com que o menino, cujo pai é presidiário e cuja mãe já havia cumprido pena, abraçara o crime. O que faz com que alguém siga essa trilha? Criação, genes, oportunidades, acaso?

A resposta é quase certamente uma combinação de todos esses e de outros fatores. Intuitivamente, tendemos a acreditar que a criação desempenha o papel preponderante. Que ela importa, não há dúvida, mas talvez numa escala menor do que a que imaginamos. Gostamos de acreditar que é ela que faz a diferença, porque isso alimenta a ilusão de que estamos no controle.

Um grande estudo populacional na Dinamarca (Mednick et al., 1987), que acompanhou registros do desenvolvimento de crianças adotadas, inclusive as sentenças penais que receberiam, mostrou que 14,7% dos filhos de genitores que nunca tiveram problemas com a Justiça mas foram criados por pais com história de delinquência acabaram sofrendo condenações por delitos contra a propriedade. Já entre os descendentes de pai sem antecedentes criados por pais adotivos também honestos, a taxa de desencaminhados foi de 13,5%, uma diferença pouco significativa.

A história muda um pouco para os filhos de criminosos criados por pais honestos. Aqui, a delinquência atingiu 20% –um bom indício de que a genética influi. Na ponta restante temos os filhos de criminosos educados por criminosos. A taxa de desviados nessa categoria foi de 24,5%. Esse seria um sinal de que a criação, afinal, faz diferença, ainda que mais para o mal do que para o bem.

A moral da história é que os estudos de genética comportamental assustam. Mas não é porque não gostamos de suas conclusões que devemos ignorá-los. De qualquer maneira, em tese há espaço suficiente para fatores ambientais suplantarem as piores predisposições genéticas.


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