Folha de S. Paulo


Resposta errada

SÃO PAULO - A democracia é superbacana, mas tem lá seus probleminhas. Um deles é o fato de que autoridades se sentem na obrigação de dar respostas imediatas a todos os eventos de grande repercussão.

Por vezes isso é possível. Há situações em que o problema admite mesmo uma solução racional simples. Só que a maior parte das questões que nos afligem é mais complexa e não comporta saídas unidimensionais. Autoridades raramente se deixam abater por esse tipo de detalhe lógico e dão sua resposta do mesmo jeito. Assim surgem políticas que são ineficazes ou francamente erradas.

Penso que a imposição de torcida única nos clássicos de futebol, decidida pela Secretaria da Segurança Pública após a morte de uma pessoa devido a uma briga entre corintianos e palmeirenses, além de juridicamente discutível, contém equívocos filosóficos, conceituais e fáticos.

Para começar, mortes em brigas de torcida, embora lamentáveis e particularmente estúpidas, não são a grande ameaça que paira sobre nossas cabeças. Desde 2010, foram a óbito nessas circunstâncias 113 pessoas em todo o país. No pior ano, que foi 2010, morreram 30, mas esse número vem caindo. Em 2015, foram 15. A última cifra representa 0,007 óbito por 100 mil habitantes, ou menos de 1/5 das mortes provocadas por raios.

E não é só. As brigas raramente se dão nos estádios e, num agravamento da lei de Pareto, um reduzido número de indivíduos parece responder pela maior parte da violência. É incrível que a polícia ainda não tenha conseguido montar um caso sólido contra essas pessoas, cujos nomes são conhecidos até da imprensa.

Assim, é difícil justificar que a solução para um problema de pouca relevância epidemiológica, que poderia ser minorado com mais de empenho da polícia, exija privar milhares de torcedores de diversão legítima. Pior é sugerir à sociedade que não há nada de errado em punir inocentes para tentar neutralizar culpados.


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