Folha de S. Paulo


A democracia na avenida

É democrático fechar a avenida Paulista para carros aos domingos, a fim de que a via se transforme em área de lazer? Se submetêssemos a proposta do prefeito Fernando Haddad a escrutínio popular, não há muita dúvida de que seria aprovada por larga margem.

Eu próprio votaria a favor, embora deva admitir que meu sufrágio teria algo de frívolo, já que não tenho nenhuma intenção de frequentar o parque improvisado. Meu "sim" ao fechamento teria como principal motivação uma espécie de solidariedade para com os comunícipes. Acho bacana que as pessoas tenham espaços para divertir-se e conviver.

Os frequentadores, sejam atuais ou apenas potenciais, porém, são só parte da equação. Não podemos esquecer que existe uma população que reside na avenida que é bastante prejudicada pela interdição. Ter de avisar previamente as autoridades quando pretende sair de casa motorizado para que seja providenciada uma escolta não é algo que possa ser descrito como um incômodo menor. Algo parecido vale para os comerciantes da região, que se queixam de que a mudança nas regras lhes impõe boas perdas no faturamento.

Obviamente, meu voto não deveria ter o mesmo peso do de um cidadão que more ou trabalhe na avenida. No meio do caminho, há o daqueles que de fato usam a Paulista como área de lazer. A democracia ainda não desenvolveu mecanismos para lidar com situações como essa. Quantos "sins" de usuários seriam necessários para contrabalançar um "não" de residente?

Os moradores da Paulista que se opõem ao fechamento são que tipo de minoria? Uma cujos interesses podem ser legitimamente sobrepujados pela vontade da maioria, ou uma cujos direitos devem ser preservados mesmo que contra o desejo da maior parte da população? Sinceramente não sei. Inclino-me pela primeira, mas creio que pensaria diferente se residisse ali. É complicado.


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