Folha de S. Paulo


Quando jogar a toalha?

SÃO PAULO - Eduardo Cunha parece ter sido apanhado em flagrante delito de mentir para uma CPI sobre suas contas no exterior, mas se agarra obstinadamente ao cargo de presidente da Câmara. Dilma Rousseff, cujo governo está nos estertores devido a uma combinação tóxica de barbeiragens econômicas e lorotas de campanha, ainda insiste em que não cometeu nenhum grande equívoco. A crise que vivemos seria resultado de problemas externos. Políticos não sabem quando chega a hora de jogar a toalha?

Tudo indica que não. A teimosia, embora não figure entre as grandes virtudes enaltecidas por todos, tem valor adaptativo. O bicho que cai na armadilha do predador e faz o possível e o impossível para tentar fugir tem uma chance, ainda que mínima, de escapar. O que se entrega ao que parece inevitável, não. Nesses casos, chamamos a teimosia de "tenacidade" ou "perseverança", mas é da mesma coisa que estamos falando.

Mesmo em contextos mais humanos, por vezes é racional ser irracional. O sujeito que cultiva com esmero a fama de pavio curto, isto é, de reagir de forma tresloucada a provocações, leva vantagem em algumas circunstâncias. Um ladrão prudente, por exemplo, vai evitar mexer com ele, preferindo vítimas mais dóceis.

O problema é que há também situações, talvez até mais numerosas, em que a teimosia não se paga. Isso é particularmente verdade quando ela se apoia, não em objetivos evolutivamente indiscutíveis, como sobreviver a um predador para continuar existindo, mas no autoengano. E o autoengano, como se sabe, é especialmente prolífico em ambientes complexos, como o da política, em que as narrativas não são unívocas e as pessoas têm a oportunidade de agarrar-se aos fiapos de razão que preferirem. Essa teimosia que se alimenta de ilusões é particularmente prejudicial, pois faz com que nos sintamos confortáveis no erro e nos leva a lutar quando deveríamos nos render.


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