Folha de S. Paulo


O erro de Piketty?

SÃO PAULO - Recebi de meu amigo Eduardo Giannetti uma interessante resenha de Deirdre McCloskey sobre o best-seller de Thomas Piketty, "O Capital no Século 21", que, se não encerra o debate, dá o que pensar.

Eu deveria ir direto ao cerne, mas não resisto em fazer um pit-stop na fofoca. McCloskey, para quem não conhece, chocou a academia americana ao anunciar, nos anos 90, que trocaria de sexo. Donald McCloskey, um "Chicago boy" que construíra sólida reputação com trabalhos sobre o papel da persuasão na economia e atacando a má matematização que se assenhorou da disciplina, estava se tornando Deirdre. A experiência virou um livro, "Crossing: a Memoir".

Voltando a Piketty, McCloskey faz o elogio de praxe (um incrível trabalho de coleta de dados), mas detona a obra do francês, que acusa de estar equivocado "em sua ciência e ética social". Os dois problemas mais graves, diz McCloskey, é que Piketty não leva em conta a curva de oferta nem o capital social, o que torna suas previsões irrealisticamente pessimistas.

No primeiro erro ele estaria acompanhado de Malthus, que também não teria sido capaz de antecipar que inovações podem mudar completamente o jogo. No segundo, ele simplifica demais as coisas, ao contabilizar apenas patrimônio e renda do trabalho. "Se a renda for corretamente medida para incluir melhores condições de trabalho, mais anos de educação, melhor assistência à saúde, mais anos de aposentadoria, mais subsídios sociais e, acima de tudo, a crescente qualidade e maior abundância dos produtos, então a renda dos pobres cresceu", diz a autora.

E ela coloca alguns números. Nos últimos dois séculos, o mundo assistiu ao "Grande Enriquecimento", pelo qual o habitante médio do planeta teve sua riqueza multiplicada por dez, chegando a 30 nos países desenvolvidos. Para McCloskey, melhorar as condições de vida é muito mais importante do que evitar que milionários herdem sete Rolex de uma vez.


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