Folha de S. Paulo


Promotores de Santana

SÃO PAULO - Provavelmente não passa de uma coincidência, mas não há como não reparar na ironia poético-geográfica. No início dos anos 80, as Senhoras de Santana ganharam fama ao protestar contra a "imoralidade" na TV e exigir censura a certos programas.

Trinta anos depois, no mesmo espírito de cruzada moral, a Promotoria de Justiça do bairro de Santana, em São Paulo, vem promovendo uma verdadeira perseguição contra o jovem artista MC Pedrinho, que, aos 13 anos, se notabilizou por compor e cantar funks repletos de palavrões e com forte conteúdo sexual.

Primeiro ele foi proibido de dar shows, e a Justiça também mandou retirar do YouTube as suas canções. Agora o Ministério Público (MP) santanense fez com que os representantes do garoto assinassem um termo de ajustamento de conduta pelo qual se comprometem a sanitizar a produção do funkeiro. Para poder voltar a se apresentar, MC Pedrinho passou a falar em fé e entoar loas ao Senhor.

Ninguém é obrigado a apreciar a produção artística do jovem. Eu mesmo não sei se gosto, já que, graças à censura judicial, não pude ouvir suas músicas. A tentativa de enquadrá-lo, porém, recende a moralismo.

Nem a Constituição nem o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) preveem a possibilidade de o Estado proibir menores de idade de escreverem ou cantarem o que bem entenderem, ainda que não passe de deslavada pornografia. O ECA é totalmente explícito ao afirmar, no art. 16, II, que jovens gozam de plena liberdade de expressão. Se os shows, mesmo que classificados como impróprios, são realizados sem a presença de menores desacompanhados, estão em princípio dentro da lei.

Buscar no ECA e na CLT subterfúgios legais que não são aplicados a outros músicos mirins apenas escancara o caráter persecutório e moralista da campanha do MP de Santana. O pau aqui acerta o Chico, mas nem rela nos Franciscos.


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