Folha de S. Paulo


Do direito de morrer

SÃO PAULO - A revista "The Economist" dedicou a capa de sua edição da semana passada (27/6) à eutanásia, que classificou como "o direito de morrer". Para o periódico, assim como não faz sentido que governos tentem ditar o que dois adultos podem voluntariamente fazer em matéria de sexo, não cabe ao Estado interferir nas escolhas que uma pessoa faz acerca de sua própria morte. Eu não poderia concordar mais.

Segundo a publicação, é no terreno da eutanásia que devemos esperar a próxima onda de liberalização. Embora o auxílio médico para morrer seja permitido apenas num punhado de países europeus, na Colômbia e em cinco Estados dos EUA, multiplicam-se as propostas legislativas e casos judiciais que poderão legalizar a prática. Só nos EUA, são 20 os Estados que poderão fazê-lo. A estes, somam-se Reino Unido, Canadá, Alemanha e África do Sul.

A experiência de quem legalizou mostra que as principais objeções dos que se opunham à eutanásia não se materializaram. A morte assistida não se converteu numa alternativa barata aos cuidados paliativos, para a qual seguradoras e governos empurrariam os mais vulneráveis. A julgar pelo que ocorreu no Oregon, temos exatamente o contrário desse cenário. O Estado permite a morte assistida desde 1997 e, nessas quase duas décadas, apenas 1.327 pessoas recorreram às drogas letais, a maioria gente com bom nível de instrução, que possuía seguro e estava recebendo cuidados paliativos.

Obviamente, médicos já ajudam pacientes a morrer mesmo em países onde isso não é permitido por lei. Eles recorrem às chamadas zonas cinzentas, como suspender tratamentos ou administrar doses letais de analgésicos. O problema dessas soluções informais é que elas reduzem a autonomia do paciente, que deveria ter o direito de articular suas escolhas, e acrescentam mais uma boa dose de hipocrisia ao mundo.

P.S. - Dou um mês de férias ao leitor.


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