Folha de S. Paulo


O libertarismo

SÃO PAULO - Nos EUA, a filosofia libertária atrai um número significativo de adeptos. Apesar de ela ser em vários aspectos radical, políticos que se proclamam libertários, como Ron e Rand Paul, conseguem eleger-se para o Congresso. No resto do mundo, porém, o apelo dessa doutrina é bem menor. Por quê?

"Libertarian Philosophy in the Real World", de Mark Friedman, embora não ofereça uma resposta precisa à questão, traz boas pistas. O libertarismo, ainda que não se confunda com a anarquia, está perigosamente perto dela. Para os adeptos dessa filosofia, o papel do Estado deveria ser apenas promover a segurança e zelar pelo cumprimento de contratos. Todo o resto poderia ser providenciado com vantagens por agentes privados guiando-se pelo mercado.

Como mostra Friedman, a base de tudo é a ideia de que cada indivíduo tem direito natural ao próprio corpo e aos bens de que consegue apropriar-se sem cometer fraude. O libertarismo, vale lembrar, vem em diversos sabores. A variante mais consistente é a proposta por Robert Nozick, que faz esses direitos naturais se firmarem no imperativo categórico kantiano. A exigência de que todos os indivíduos sejam tratados também como meio e não só como fim torna ilegítimo que o Estado utilize cidadãos para promover qualquer objetivo social com o qual não tenham concordado. Isso significa que instrumentos que a maioria das democracias julga óbvios, como o IR progressivo, são, aos olhos de libertários, indistinguíveis de roubo. Por alguma razão, tais ideias não se afastam muito do individualismo radical embutido no "american dream".

De minha parte, penso que os raciocínios libertários são ótimos para mostrar os limites de filosofias rivais, como o utilitarismo. Receio, porém, que o pressuposto do libertarismo, isto é, a ideia de que cada indivíduo é um ser autônomo que no máximo toleraria algumas interações sociais, está antropologicamente errado.


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