Folha de S. Paulo


Nada vai dar certo

SÃO PAULO - Como vem ocorrendo nos últimos anos, o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) divulga a taxa de reprovações no exame de final de curso a que submete os futuros médicos e todo o mundo se escandaliza. Neste ano, 55% dos candidatos acertaram menos de 60% das respostas, resultado que está em linha com os das duas edições anteriores.

O quadro é realmente desalentador, mas cabe uma observação. Por uma questão legal, a prova sofre de um defeito insanável: o recém-formado é obrigado a comparecer no dia do teste e entregá-lo, mas tanto faz tirar zero ou dez. Ele recebe o diploma de qualquer jeito e a nota é secreta. É lícito supor, portanto, com base no que sabemos sobre a natureza humana, que, se estivéssemos diante de um exame para valer, os resultados seriam um pouco melhores.

Para mudar essa situação esdrúxula, o Congresso teria de aprovar uma lei que tornasse a aprovação no exame precondição para o exercício da medicina. Sem isso, a prova é mera formalidade burocrática, que o Cremesp usa para pôr em evidência o problema da formação médica.

E por que a prova não se torna obrigatória, como já ocorre no caso dos advogados? A questão é complexa e existem vários elementos. Destaco o mais óbvio. Governantes das esferas federal, estadual e municipal precisam desesperadamente de médicos. Nessas condições, não faria muito sentido instituir um filtro que barre alguém que já fez seis anos de curso e está a um passo de poder, senão exercer boa medicina, ao menos ajudar a resolver as escalas abertas dos postos de saúde e hospitais.

Ao contrário, com as medidas adotadas pelo Planalto para formar mais médicos, serão aceitos nos cursos alunos menos preparados que a média atual, que se converterão em profissionais também menos preparados. O problema, no fundo, é que nosso ensino básico é ruim. Se não acertarmos isso, nada vai dar certo.


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