Folha de S. Paulo


Só uma teoria

SÃO PAULO - "É só uma teoria". É com essa expressão que os adeptos do design inteligente tentam diminuir a importância e o alcance da evolução darwiniana e, assim, abrir espaço para a ideia de que a vida é complexa demais para ter surgido sem o auxílio de uma inteligência.

A teoria do design inteligente (TDI) poderia ser relegada ao campo das cantilenas religiosas e ignorada, se seus entusiastas não tentassem travesti-la de ciência e pressionar para que seja ensinada nas escolas públicas, como defenderão os participantes do 1° Congresso Brasileiro de TDI a realizar-se em Campinas.

Se a turma da TDI quer prestar um favor ao ensino, deveria começar por parar de confundir os sentidos de "teoria". A rigor, toda explicação científica é sempre "só uma teoria", isto é, algo que aceitamos como verdade provisória até que surja uma explicação mais precisa ou completa.

E, em linhas gerais, a síntese darwiniana está tão solidamente estabelecida quanto a lei da gravidade, que também é "só uma teoria". As corroborações vêm de todas as frentes, desde a evolução de bactérias (notadamente o trabalho de Richard Lenski) até modelos de computador, passando pelo experimento natural da resistência a novos antibióticos.

É claro, porém, que ainda há buracos e pontos obscuros a explicar. Uma teoria que não tenha problemas é uma má teoria. Ou ela não tem conteúdo empírico que a ponha à prova ou é tão logicamente abstrusa que nem pode ser contestada. Mas não dá para, ao menor sinal de dificuldade, inferir um deus ou uma inteligência, como faz o pessoal da TDI. A gravidade, por exemplo, tem problemas até mais sérios que a evolução. Ela é incompatível com a mecânica quântica. Mas nem por isso as pessoas saem por aí dizendo que é Deus quem guia a órbita dos planetas ou lança os objetos ao chão.

Problemas científicos se resolvem com mais pesquisa, não pedindo socorro a papai do céu.


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