Folha de S. Paulo


Nem sequer errado

SÃO PAULO - A história talvez seja apócrifa, mas é muito boa. Um dia um amigo do físico Wolfgang Pauli lhe mostrou um artigo particularmente confuso escrito por um estudante e pediu sua opinião, ao que o cientista austríaco teria sentenciado: "Não é só que não esteja certo; não está nem sequer errado".

A frase vem sendo usada desde então como crítica a textos desprovidos do conteúdo empírico mínimo para que possam ser avaliados. Lembrei da historieta a propósito dos programas dos candidatos à Presidência. Além da versão burocrática exigida pela Justiça Eleitoral no registro da candidatura, os principais postulantes ofereceram poucos elementos para o eleitor julgar suas ideias.

Marina Silva até apresentou um documento formal, em que pese ter sido elaborado às pressas e conter inconsistências. Tê-lo feito, porém, não só não contou como ponto a favor como ainda revelou-se uma vulnerabilidade. A divulgação do programa rendeu-lhe alguns dos ataques mais fortes que sofreu.

Como consequência, Aécio Neves optou por publicar um texto mais enxuto –e vago–, frisando que as ideias ali apresentadas ainda estão sendo debatidas. Mais direta, Dilma Rousseff decidiu que não lançar nenhum plano detalhado.

O resultado final é ruim para a democracia. Os candidatos não só evitam comprometer-se com propostas concretas –que, sob determinados parâmetros, poderiam ser classificadas como certas ou erradas– como deixam de expor-se à crítica, o que poderia revelar bastante sobre sua personalidade e estilo de governar.

Venho há tempos martelando a tese de que, em eleições, o cérebro emocional tende a falar mais alto do que o córtex pré-frontal. Daí não decorre, porém, que a razão seja dispensável. Mesmo que sejam poucos os que votam com base nas propostas apresentadas, são elas que permitem depois verificar se o governante se manteve fiel a seus compromissos.


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