Folha de S. Paulo


O último a saber

SÃO PAULO - Conforme prometido, discuto hoje a importância das campanhas eleitorais. Uma corrente de cientistas políticos sustenta que elas são bem menos decisivas do que apregoam marqueteiros e jornalistas. Os argumentos que eles apresentam merecem consideração.

Nos EUA, onde a série democrática é ininterrupta desde o século 18, tendo permitido um considerável acúmulo de dados, pesquisadores desenvolveram vários modelos de previsão eleitoral que são bastante consistentes. Não estamos falando apenas em indicar quem vencerá, o que é relativamente fácil num sistema bipartidário, mas de cravar os números da votação com grande antecipação e boa margem de acerto.

E há modelos para todos os gostos, desde o minimalista "pão e paz", desenvolvido por Douglas Hibbs, que se vale apenas do aumento da renda per capita e do índice de baixas militares dos EUA em conflitos internacionais, até as análises de Nate Silver que fazem um "pot-pourri" de indicadores e métodos.

E o fato de esses modelos funcionarem razoavelmente bem leva a um paradoxo. Como bem colocou Andrew Gelman, se os votos são tão previsíveis, por que as pesquisas variam tanto? Para Gelman, enquanto o eleitor se informa sobre a disputa (o que ocorre em geral durante a campanha), ele dá suas rateadas, desencadeando as gangorras registradas pelas sondagens. Mas, ao fim e ao cabo, quase sempre confirma as previsões. Como o marido traído, o eleitor é o último a saber seu voto.

Isso significa que devemos aposentar as campanhas? Eu não iria tão longe. Em eleições apertadas, como parece que será a nossa, incidentes de campanha podem fazer toda a diferença. Acho, contudo, que sua importância apenas relativa é um bom argumento para que tentemos barateá-las substancialmente. Elas hoje servem muito mais ao interesse de financiadores, marqueteiros e mídia do que ao dos eleitores.


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