Folha de S. Paulo


Uma história do ateísmo

SÃO PAULO - Em "Imagine There's No Heaven" (imagine que não há paraíso), o jornalista Mitchell Stephens se propõe a contar a história do ateísmo e mostrar como a descrença foi importante para fundar o mundo moderno. Não é uma tarefa fácil, mas o autor consegue cumprir seus objetivos e ainda oferece ao leitor uma narrativa fluida, informativa e gostosa de acompanhar.

Uma das principais dificuldades para traçar a história do ateísmo diz respeito às fontes. Em momentos de maior religiosidade, textos ateus (quando não seus autores) costumavam parar em fogueiras. Isso faz com que só tenhamos relatos indiretos, muitas vezes elaborados pelo inimigos, das ideias de figuras capitais como o filósofo grego Diágoras de Melos ou os caravaka, a escola de pensamento hindu que nega não apenas os deuses mas também a reencarnação, o nirvana e tudo aquilo que chamaríamos de religioso.

E não é só. Mesmo quando autores se arriscavam um pouco mais, procuravam disfarçar suas reais opiniões para que não se afastassem tanto da ortodoxia. Graças a isso, não temos muita certeza se devemos classificar como ateus, agnósticos ou deístas filósofos do porte de David Hume e Thomas Hobbes.

Apesar desses obstáculos, Stephens mostra muito bem como o ceticismo e a contestação às ideias estabelecidas estão na base não apenas da revolução científica como também dos movimentos políticos e filosóficos que desembocariam no Iluminismo, nas revoluções francesa e americana, na modernidade, enfim.

Ao contrário de várias publicações recentes que tratam do ateísmo, "Imagine" não é um texto militante. Stephens diz logo nas primeiras páginas que é preciso reconhecer as contribuições da religião para as vidas das pessoas, as artes e até para a moralidade, mas que isso não é motivo para deixar de ver tudo de importante que brotou da ideia de que vivemos sem deuses.


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