Folha de S. Paulo


Três sonetos de amor para tempos de crise

Ah, o amor –te dirão– é coisa séria
Mas depois de brincar de gato e rato
Quem brincou já não quer pagar o pato
E do amor só herdamos as bactérias

Depois da tempestade, a miséria
Quem comeu já não quer lavar o prato.
O que te resta, amigo, é muito chato,
e alguma outra doença venérea.

Catarina Bessel/Folhapress

Não acreditem no que diz a mídia.
Amor só dá em filhos ou clamídia
Sim, eu sei que parece boa ideia

Mas amor é pior que hanseníase
Se você tiver sorte é candidíase
Se você não tiver é gonorreia

*

Encontrei-a no Tinder de Manhã
Logo quis conhecer melhor ao vivo
mas pediu: "Me adiciona no Instagram"
E seguimos em outro aplicativo

Foram meses e meses de Facebook
e até hoje ficamos no virtual
Inda torço pra que ela me cutuque
(não no Face, ao contrário, no meu pau)

Há quem goste de homem, de mulher,
De animal, de cadáver, de apanhar
E há quem goste como esse meu affair

de manter relação com avatar
Só me resta pensar: "Fiz o que pude"
e me alegrar que recebi um nude.

*

Outro dia, no meio da trepada,
Minha amada mulher chamou-me Heitor
Meu nome é Paulo, amor, cê tá pirada?
Me chama pelo nome, faz favor

Minha mulher, talvez, embriagada
Revelou ter tesão no professor
e me pediu pra dar uma atuada
já que faço alguns bicos como ator

Desde então já fui tudo: o cantor Belo,
padre Fábio, já fui padre Marcelo
E o deputado Jorge do Torresmo

Pode gritar, amor, fazer barulho:
Que hoje eu posso dizer com muito orgulho:
Mi'a mulher só me trai comigo mesmo.


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