Folha de S. Paulo


Vida de jogador: eu só quero pensar no jogo

Muito boa a iniciativa de alguns de nossos clubes liberarem seus jogadores da concentração. Além do fator econômico, é uma forma de mostrar que os times já confiam em seus atletas e uma boa oportunidade para os jogadores provarem que são realmente profissionais e que conseguem se preparar para uma partida sem ter alguém vigiando ou regulando seus horários.

Eu sempre fui a favor de os jogadores dormirem em suas casas e só se apresentarem horas antes das partidas. Mas, para minha surpresa, existem jogadores que fazem questão de se concentrar e que preferem passar a noite anterior a uma partida com um companheiro de equipe que com a própria família.

No início desta semana, por sorte, tive a oportunidade de falar com um jogador de um tradicional time paulista sobre o assunto. Sei que a curiosidade é grande, mas prometi ao atleta que não revelaria seu nome - como sempre fiz nos textos que contam um pouco da vida dos jogadores profissionais (abaixo relaciono alguns). Mas vamos ao que ele diz.

"Olhe, rapaz, eu gosto de me concentrar, e muitos dos meus companheiros também preferem isso. No começo de carreira, você pode até pensar que é a concentração é uma coisa chata, pois poderia ter uma folga - apesar de que alguns aprontam mais na concentração do que se estivessem com a noite livre -, mas, com o tempo, você vai aprendendo que ela é fundamental."

Quando você tem família, então vê como ela é importante. Não dá, se eu fico em casa até o dia da partida, não tenho tempo de pensar no jogo. Não adianta, não tem como ter sossego. Para quem mora com você, o fato de estar em casa significa que é sua de folga. Ninguém vai se importar com o fato de você chegou do treino, cansado, e precisa repousar porque, amanhã, vai ter que jogar 90 minutos.

Eu tenho mulher e filhos. Lógico que, para minha esposa, eu estando em casa, independente do que eu vou ter que fazer no dia seguinte, eu sou um marido normal. Ou seja, a noite que eu passar em casa, antes do jogo, vai ser encarado como um dia que estou de folga, o que não é.

Amo meus filhos e minha esposa e tento estar ao lado deles o máximo que posso. Mas, na noite antes de um jogo, eu prefiro ficar quieto, conversar com um companheiro sobre a partida do que discutir algo como a troca do sofá da sala, por exemplo. Isso eu não vou conseguir estando em casa. É bem provável também que eu tenha que responder, antes de cada jogo, por aquilo que eu posso ou não comer. Fora que sempre pode aparecer uma visita que não vai te deixar em paz e fazer você perder algumas horas de sono.

No dia da partida, antes da apresentação para o clube, sei que não vou conseguir dormir o suficiente. Em casa, a movimentação começa cedo e, por mais que as pessoas evitem fazer barulho, fica impossível não acordar. Sem dizer que muitas vezes eu faço questão de levar as crianças ao colégio, coisa que eu faço nos dias que não temos treinos no período da manhã.

Também acho que, quando o time passa a noite concentrado, fica mais fácil todos estarem na mesma frequência. Já tive essa experiência de cada jogador dormir em sua casa e isso fez com que demorasse muito mais para se conseguir uma integração total dos jogadores e tudo fica mais disperso. Até o treinador tem muita dificuldade para fazer a preleção.

Eu só quero pensar no jogo, por isso, para mim, a concentração é fundamental."

Até a próxima!

Mais pitacos em: @humbertoperon

DESTAQUE
Para as excelentes reações de Grêmio e Atlético-PR no Campeonato Nacional, que, a cada rodada, se aproximam cada vez mais dos líderes da competição.

ERA PARA SER DESTAQUE
Para a péssima campanha do Náutico, que dificilmente escapa do rebaixamento. Ao optar em jogar na moderna Arena Pernambuco, o clube perdeu um de seus maiores trunfos, que era jogar no estádio dos Aflitos. No seu antigo estádio, o time era praticamente imbatível, crescia de produção e dificilmente perdia pontos.

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