Folha de S. Paulo


Não há o ultrapassado nem o moderno

O futebol, dentro das quatro linhas, basicamente é o mesmo desde que foi inventado, no final do século 19. Apesar de muitos adorarem dar rótulos de ultrapassado ou moderno para determinados profissionais, afirmo que esses conceitos não cabem ao esporte.

O que acontece é que algumas premissas às vezes estão na moda e, por alguns períodos, são deixadas de lado. Depois de algum tempo esquecidas, elas voltam e ganham o status de novidade.

Apontada como a grande revolução do futebol nos últimos quarenta anos, a Holanda de 1974 tinha, em sua essência, o futebol como era jogado em seus primórdios. Ou seja, o máximo de jogadores perto da bola, tentando conquistá-la e buscando sempre o gol.

O resgate do futebol "original" pela chamada "Laranja Mecânica" foi um sucesso porque o técnico Rinus Michels, com um elenco de craques, conseguiu organizar a "bagunça" utilizando também alguns conceitos do time da Hungria de 1954 - que igualmente encantou o planeta, mas, como a Holanda, acabou perdendo a decisão da Copa do Mundo para os alemães.

O próprio Barcelona, que nos últimos anos seduziu a todos, tinha como base a troca de passes constantes, que, por muito tempo, foi a principal característica dos grandes times brasileiros e argentinos.

Muitos adoram dizer que a modernidade está no 4-4-2, com as linhas de defesa e meio-campo bem definidas. Não dá para chamar esse esquema de novo. Os ingleses, já na década de 1960, utilizavam esse esquema. Inclusive, a Inglaterra foi campeã da Copa de 1966 usando esse estilo. Aliás, por muitos brasileiros acharem esse modo de jogar moderno, o nosso futebol, em alguns aspectos, se transformou no que era o futebol inglês nos anos 1970. Com festival de cruzamentos para a área e a ligação direta, via chutões, da defesa para o ataque.

Outra vertente cita o 4-3-3 como o mais atual que existe no futebol. O básico desses esquemas é muito velho, no mínimo uns 60 anos, e por muito tempo foi o mais utilizado em nosso país.

As pessoas que ficam maravilhadas com os jogadores atuando abertos pelas laterais do campo esquecem que essa é a função dos jogadores que eram chamados de pontas. Não custa lembrar que essa posição foi tida como extinta nas décadas de 1980 e 90, quando se dizia que era um retrocesso ter um jogador que ficasse ocupando a lateral do campo e não ajudasse na movimentação. Até foi criado um bordão que decretava o final dos pontas, como Garrincha e Edu: "O importante é jogar pelas pontas e não ter pontas".

Não falta muito para alguém achar contemporâneo e chamar de gênio um técnico que decida utilizar um desses pontas para ajudar os jogadores de meio. Aí teremos de lembrar que Telê e Zagallo já realizavam essa função nos anos 1950.

Ainda sobre as laterais do campo, dou risada quando alguns dizem que foi uma grande sacada do treinador inverter os atacantes que atuam pelos lados do campo. A expressão "inverter os pontas" era usada para classificar um treinador como incompetente, pois sem ter um repertório para trocar a forma de o time atuar, o técnico apelava sempre para a inversão de posição dos ponteiros.

Também fico espantado quando alguém fala que é antenado o treinador que usa o volante para atuar como um terceiro zagueiro, e que isso propicia segurança defensiva e não ser surpreendido. Isso é mais uma coisa antiga. Por muito tempo se utilizou um dos volantes bem recuado, para que um dos dois zagueiros pudesse atuar na sobra.

Não existe nada mais moderno do que o esquema que fez o seu time ganhar o último jogo - e ele pode já ficar superado na próxima partida.

Até a próxima!
Mais pitacos em: @humbertoperon

DESTAQUE
Para o Atlético-MG, que é o melhor time do país no momento. A equipe liderada por Cuca, como dever fazer quem é grande, parte para cima dos adversários e impõe sempre o seu ritmo de jogo, com o poderio de seu quarteto ofensivo formado por Ronaldinho, Bernard, Tardelli e Jô. Por isso, é uma injustiça dizer que a equipe só atua bem no Independência, pois, fora de seus domínios, o time joga da mesma forma.

ERA PARA SER DESTAQUE
Mais do que discutir a não convocação de Ronaldinho ou Kaká, é preciso dizer que a lista de Luiz Felipe Scolari escancara que o nosso futebol está cheio de jogadores comuns e que não temos nenhum craque no momento - Neymar e Lucas podem ter potencial, mas ainda não podem ser chamados assim. Com um time de novatos, Felipão aposta na Copa das Confederações para dar experiência aos jogadores e sair com a base do time que vai disputar a Copa do Mundo no próximo ano.


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