Folha de S. Paulo


A hora de Hamilton

Schumacher estava no centro da mesa. À sua direita, Hakkinen. À esquerda, o irmão, Ralf.

"Extasiado talvez seja a palavra errada. Eu não tenho vocabulário para algo que vai além disso. Peço desculpas, mas estou feliz, estou esgotado..."

Diante da pausa, o entrevistador então cita que aquela havia sido sua 41ª vitória, igualando a marca de Senna. E pergunta se aquilo significava muito para ele.

"Sim. Significa muito para mim..."

O alemão então cai num choro compulsivo. Não consegue mais falar. É amparado pelo finlandês, que assume a vez nas respostas da entrevista coletiva.

Aconteceu em 10 de setembro de 2000, em Monza.

Quinze anos depois, a F-1 está prestes a testemunhar cena semelhante.

Goste-se ou não de Senna, é inquestionável o fato de que ele deixou um legado _palavrinha tão em voga atualmente, tão banalizada, mas que raras vezes é usada de forma adequada.

Há, na F-1, aqueles que veneram o brasileiro. Schumacher era um deles. E carregava ainda alguns pesos extras. Como o de ter sido o último grande rival do tricampeão. Como o de ter visto tão de perto o acidente na Tamburello.

Hamilton pertence ao mesmo clube.

Desde sempre tem Senna como grande ídolo. A pintura do capacete é inspirada na do brasileiro. Sempre que vem ao Brasil, arruma um jeito de visitar o cemitério do Morumbi. A cada grande conquista, reserva uma citação a seu herói.

Pois agora chegou a vez de Hamilton tentar a emblemática 41ª vitória.

As chances que venha em Cingapura são enormes. O inglês venceu 7 dos 12 GPs até agora, inclusive os dois últimos. Colocou o companheiro no bolso. Está sobrando na pista. Ruma para o tricampeonato _outra marca do brasileiro que certamente igualará.

A tentação da comparação é enorme. Nos últimos dias, sites e publicações especializados desfiaram textos e quadros comparando Senna e Hamilton.

A opinião deste colunista é que Senna o venceria, mas que a briga seria boa. Como seria boa com Fangio, Schumacher, Prost, Piquet, Clark, Moss, Rindt. Os grandes.

Puro achismo, papo de botequim, o tipo de conversa que dá graça ao esporte.

Minha maior curiosidade, mesmo, é para a reação de Hamilton quando esta 41ª vitória chegar.

"Meu sonho, quando criança, era ser igual ao Ayrton. Certamente a emoção vai ser grande", disse o inglês, num evento para patrocinadores da Mercedes.

Uma coisa é uma declaração fria e ensaiada, num ambiente cercado de câmeras e flashes. Outra é cruzar a linha de chegada, na solidão do cockpit e ver a história passar diante dos olhos.

Vai ser em Cingapura ou no Japão ou na Rússia... Mas vai ser.

E vai ser merecido.


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