Folha de S. Paulo


Balcão de negócios

Quando as montadoras resolveram tomar a F-1 de assalto, no final do último século, o senso comum comemorou. O patrocínio tabagista estava com os dias contados, as empresas de tecnologia resistiam à ideia de investir num esporte tão poluente, o futuro parecia sombrio.

De repente, começou uma corrida das grandes fábricas para estampar suas marcas nos carros da categoria. Uma benção. Alvíssaras.

A Mercedes comprou parte da McLaren. A Ford apadrinhou a Stewart e depois assumiu a operação, lançando a Jaguar. A BMW começou a fornecer motores para a Williams e depois comprou a Sauber. A Toyota montou uma estrutura megalomaníaca em Colônia e estreou como equipe própria. A concorrente Honda, claro, não quis ficar atrás: colocou dois times na pista –lembram da Super Aguri?

Só uma voz se levantou contra a euforia generalizada. Ecclestone.

O ponto do inglês é que essas megacorporações são impessoais demais. Não têm o menor comprometimento com o futuro do esporte. Mudam de ideia a cada mudança de CEO. Veem a F-1 como mera plataforma de marketing, apenas mais uma, como anúncios em revistas ou exibições pirotécnicas em salões do automóvel.

Mais: estavam entrando justamente no lugar de gente comprometida, os velhos "garagistas". Homens como Ligier, Tyrrell, Stewart, Brabham, Sauber e Jordan ou já tinham ou estavam sendo jogados para escanteio.

Jornalistas demos de ombros. Ok, ele tinha um ponto. Mas as montadoras faziam juras de amor à F-1, prometiam ficar na categoria "ad eternum".

Ecclestone estava certo.

A Jaguar deixou a F-1 em 2004 e tornou-se um dos maiores cases de como fazer tudo errado no esporte. A BMW saiu em 2009, sem planos de voltar. A Honda foi outro anti-exemplo: deixou uma equipe pronta para ser campeã sob o nome Brawn, em 2009. A Super Aguri durou só 39 corridas e fechou as portas em 2008.

Isso tem muito a ver com o grid enxuto que choramos hoje.

Lembrei disso por causa da Red Bull. Enquanto estava ganhando tudo, a F-1 era o paraíso. Mas bastaram uma temporada e três corridas sem resultados expressivos para que a fabricante de bebidas energéticas começasse a falar seriamente em sair. Este é um dos principais assuntos no paddock do Bahrein.

Do ponto de vista mercadológico, faz sentido. A missão está cumprida. A marca ganhou o mundo. Já está indissoluvelmente associada aos conceitos de velocidade, modernidade, agilidade, tecnologia.

Se a Red Bull sair, a Toro Rosso vai junto. Duas equipes a menos. Sim, porque parece improvável que alguém as assuma no atual cenário da economia mundial.

É um caminho sem volta. Os garagistas não vão voltar.

Ecclestone só não ri da situação porque, como eles, nutre sentimentos por algo que outros veem apenas como negócio.

fseixasf1@gmail.com


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