Folha de S. Paulo


Talento em vão

Pilotos costumam soltar este tipo de bravata, fazer esta jura de amor, mas Alonso soou sincero ao dizer que encerrará a carreira na McLaren.

Questionado em Xangai sobre os planos para o futuro, no começo da semana, disse que não pensa em continuar na categoria por muito mais tempo.

"Meu primeiro carro de F-1 foi uma McLaren-Honda, uma réplica feita pelo meu pai quando eu tinha 3 anos. Meu último também será", contou, com uma ternura nos olhos que derrubou qualquer ceticismo.

Compreensível.

O espanhol está em sua 15ª temporada na F-1. Tem contrato por dois anos, com opção de renovar para um terceiro. Se for pelo menos até ao fim do próximo Mundial, superará Coulthard, Trulli e Patrese e se tornará o quarto piloto da história em número de GPs.

Em julho, ele completa 34 anos. Quando apareceu pela primeira vez para o mundo da F-1, vencendo uma corrida da extinta F-3000, em 2000, em Spa, tinha 19.

Lembro bem daquele dia. Ele era um moleque, mas já apontado por muitos como um futuro campeão. E, algo fundamental, já estava sob o guarda-chuva de Briatore.

De lá pra cá, todos o vimos crescer, virar homem, conquistar títulos, se tornar o melhor piloto do grid atual. Dá para montar uma versão automobilística de "Boyhood".

A ficha de serviços prestados é longa. Se resolver parar amanhã, poderá passear de cabeça erguida pelos paddocks da vida.

Alonso fez muito. Mas, encerrando a carreira na McLaren, provavelmente será lembrado como o piloto que poderia ter feito mais. Que poderia ter sido maior. Um desperdício de talento.

Por mais que os discursos da equipe inglesa sejam otimistas, a parceria com a Honda ainda está longe de decolar. Em termos de resultados, esta temporada já está perdida. E a não ser que algo revolucionário aconteça, Alonso não deve disputar o título na próxima.

Pode encerrar a carreira, portanto, com apenas dois títulos.

Apenas? Sim, apenas. Alonso errou em várias escolhas na carreira, mas seu talento merece mais do que isso.

Não será a primeira injustiça histórica de uma F-1 que coroou medíocres como Rosberg, Jones e Villeneuve e que deixou craques como Moss, Peterson e Gurney de mãos abanando.

Mas será uma das maiores.

CHORO

À moça que chorou por ter se atrapalhado na bandeirada da Stock em Ribeirão Preto, a lembrança que até Pelé se enrolou com mesmíssima tarefa.

É do jogo. Só não erra quem não tenta. Pense que ele não alterou em nada o resultado da corrida. Até por isso, abra um sorriso, ria, faça troça do seu próprio erro.

Chora, não. O mundo ficará melhor se você sorrir.

fseixasf1@gmail.com


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