Folha de S. Paulo


Sonho e realidade

A sacada veio do jornalista Fred Sabino, colega no SporTV: se sair da Ferrari agora, Alonso deixará em sua passagem pela escuderia o mesmo número de vitórias de Massa, 11.

Massa correu por oito temporadas em Maranello. Alonso cumpre a quinta. O brasileiro conseguiu 16 poles e um vice-campeonato. O espanhol, quatro poles e três vices.

Sabemos qual é o melhor dos dois. Mas as conquistas pela equipe italiana os equiparam. Um desavisado que pegar as estatísticas pode não enxergar nenhuma diferença entre eles.

Pilotar pela mais mítica marca do automobilismo mundial é um sonho para todo piloto. A Ferrari atravessou décadas ostentando auras de excelência técnica e paixão pelo esporte. Está prestes a completar 70 anos, enquanto dezenas e dezenas de concorrentes ficaram pelo caminho. Na F-1, nenhuma equipe correu tanto (865 GPs), venceu tanto (219), fez tantas poles (207), conquistou tantos títulos de pilotos (15) e de construtores (16).

Mais uma vez, os números enganam os desavisados. Olhando para eles –apenas para eles–, a Ferrari parece ser o melhor lugar para estar.

Não é. Faz algum tempo.

Alonso caiu na tentação que outros pilotos recusaram, Emerson e Senna entre eles. Foi atraído pelo sonho, mas vive um pesadelo. E agora tenta despertar.

Se os seus números pela Ferrari mostram algo, é que ele passou longe daquilo que almejava quando deixou a Renault.

Piloto mais completo da atualidade, já acumula oito temporadas sem título. Hoje briga com um carro ruim e torce por azares dos rivais para tentar beliscar um pódio aqui, outro ali.

É muito pouco.

Alonso errou ao perseguir um sonho? Não, ninguém pode ser condenado por isso. Seu erro foi no timing –e os dois brasileiros citados aqui não foram para a Ferrari exatamente por este motivo.

O espanhol chegou a Maranello em meio a uma crise de gestão. A equipe que Schumacher construiu estava de saída, outra estava sendo montada. Com um enorme fosso de competência dividindo-as.

A coisa ficou tão feia que até Montezemolo pediu o boné. Ninguém sabe quem comandará a escuderia no ano que vem. Não há soluções no curto prazo.

Por outro lado, a McLaren acena com outro sonho: a volta da parceria com a Honda. Uma união que carrega lembranças e auras tão impactantes como as da Ferrari.

Aos 33 anos, Alonso ainda tem tempo para embarcar em uma nova grande empreitada. Ainda tem fôlego e ambição para buscar marcas que façam jus ao seu tamanho como piloto.

Ainda pode sonhar com dias melhores. Pode até dar errado. Sempre pode. Mas, repito, ninguém pode ser condenado por isso.

"Matar o sonho é matarmo-nos", escreveu Pessoa.

fseixasf1@gmail.com


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