Folha de S. Paulo


Pior recessão da história trará prejuízo permanente para alguns jovens

Joel Silva - 10.nov.15/Folhapress
SAO PAULO, SP BRASIL- 10-11- 2015 : Fila de desempregados em busca de vagas no Vale do Anhagabau.. ( Foto: Joel Silva/ Folhapress ) ***MERCADO *** ( ***EXCLUSIVO FOLHA***)
Fila de desempregados em busca de vagas no Vale do Anhagabaú

O Brasil parece estar finalmente saindo da profunda recessão na qual mergulhou em 2014, confirmada pelo IBGE, nesta terça-feira, como a pior da nossa história. Dados do primeiro trimestre indicam um possível início de retomada.

Mas o mercado de trabalho —que reage com atraso a mudanças no rumo da atividade— deverá começar a se recuperar apenas no segundo semestre deste ano.

Com a crise, a taxa de desemprego brasileira passou de 6,2%, no fim de 2013, para 12,6%, no trimestre encerrado em janeiro deste ano.

RECESSÃO BRASILEIRA
PIB do país recua 3,6% em 2016

Saltos dessa magnitude num espaço tão curto de tempo são raros e podem ter efeitos persistentes nas vidas dos trabalhadores afetados.

Um número crescente de pesquisadores tem se dedicado a investigar, por exemplo, o que ocorre com os jovens que se formam durante recessões. As conclusões não são animadoras.

Esses estudos mostram que as perdas de renda acarretadas por desemprego ou ocupações de pior qualidade no início da carreira podem ser duradouras, quando não eternas.

Em um trabalho premiado, a economista Lisa Kahn, da Universidade Yale, analisou a evolução das carreiras de homens brancos que se formaram antes, durante e depois da recessão americana do início dos anos 1980 ao longo de quase duas décadas.

Concluiu que os jovens que tiveram suas graduações durante os anos de contração econômica amargaram rendas persistentemente menores que os demais.

Ou seja, segundo Kahn, que foi conselheira do ex-presidente Barack Obama, as carreiras de quem termina a universidade em meio a uma recessão podem ser prejudicadas para sempre.

Os pesquisadores Philip Oreopoulos, Andrew Heisz e Till von Wacther analisaram os efeitos das recessões sobre a renda de graduandos canadenses entre 1982 e 1999.

Eles também encontraram perdas significativas de renda, que desapareceram apenas depois de oito a dez anos. Após esse período, os jovens trabalhadores conseguiram atingir os salários que receberiam, na mesma etapa de suas carreiras, caso suas formaturas não tivessem ocorrido em plena recessão.

Embora menos dramáticos que a conclusão de Kahn, esses resultados também contrariam a hipótese de alguns economistas neoclássicos para quem os efeitos salariais negativos de recessões seriam rapidamente corrigidos por mercados de trabalho eficientes tão logo a economia voltasse a crescer.

Além disso, Oreopoulos, Heisz e von Wacther descobriram que, para jovens graduados em profissões menos valorizadas, as perdas de renda provocadas por uma formatura em tempos de contração econômica são permanentes.

Estudos desse tipo são importantes porque ajudam a orientar os formuladores de políticas públicas. É possível que fique evidente a necessidade de medidas para amparar grupos de jovens mais vulneráveis e evitar um aumento da desigualdade de renda ou talvez para aumentar a flexibilidade no mercado de trabalho, facilitando sua contratação por empresas que pagam melhores salários após a retomada da economia.

Essas pesquisas podem contribuir também para escolhas individuais. Kahn ressalta que, à luz de suas descobertas, talvez a melhor decisão para alguns jovens seja postergar suas formaturas.

Segundo a economista, a perda salarial acumulada decorrente de adiar a entrada no mercado de trabalho pode ser menor do que o prejuízo permanente de se formar numa recessão. Kahn alerta, porém, para o fato de que, se todos os jovens estudantes resolverem fazer isso, os efeitos perigam se tornar piores. Trata-se de uma questão que requer mais estudos, conclui a economista.

No caso brasileiro, estamos mergulhados na escuridão da falta de dados e pesquisas sobre o que ocorre na transição entre a graduação e a entrada no mercado de trabalho, tanto em períodos de contração quanto de expansão econômica.

Mas sabemos que a severidade de nossa recessão é comparável a poucos eventos desse tipo em outros países. E temos o agravante de que, em meio à expansão do nosso ensino superior nos últimos anos, surgiram muitos cursos de baixa qualidade.

São fatos que sugerem que as consequências da crise para nossos jovens poderão ser similares —se não piores— do que as encontradas para outros países.


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