Folha de S. Paulo


Um projeto de extorsão contra a patuleia

Dois diretores de empreiteiras disseram à Justiça que foram extorquidos pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e seu operador financeiro, Alberto Youssef. Se não pagassem, teriam seus contratos prejudicados ou até mesmo cancelados. A tese é engenhosa. Pressupõe que empresas angelicais que fazem negócios com a Petrobras tornaram-se vítimas de dois demônios. Para que a pizza fosse ao forno, faltaria só o orégano.

A primeira denúncia da extorsão veio de Sérgio Mendes, vice-presidente e herdeiro da tradicional Mendes Junior, fundada em 1953 por seu avô. Ele contou que em 2011, a mando de Paulinho, pagou R$ 8 milhões a Youssef. Se não fizesse isso, estariam fechadas as portas e os guichês da Petrobrás. A Mendes Junior opera com o governo brasileiro há três gerações e com a Petrobras há pelo menos duas. Teve negócios bilionários (em dólares) com a cleptocracia de Saddam Hussein no Iraque. Admita-se que jamais molhou mãos alheias. Tendo sido obrigada, em 2011, não denunciou o malfeito. Seria tudo coisa do Paulinho e do Youssef.

A segunda denúncia de extorsão veio do diretor de óleo e gás da Galvão Engenharia, doutor Erton Medeiros. Seu advogado, José Luis de Oliveira Lima, explicou porque a Galvão ficou calada: "Se ele denunciasse o que estava acontecendo, era ameaçado de perder os contratos. Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef estão longe de serem Madres Teresas de Calcutá".

Bingo, "Paulinho" e Youssef são delinquentes, mas colaboram com a Viúva. Madres Teresas seriam a Galvão Engenharia e suas colegas. Segundo o doutor Erton, na origem de tudo estaria o deputado José Janene (morto um ano antes) e o dinheiro do achaque iria para o Partido Progressista. Bingo de novo, e surge mais uma Madre Teresa: o PT.

Durante a última campanha eleitoral a Galvão Engenharia deu R$ 1,4 milhão ao diretório nacional do PT, partido da doutora Dilma. Portanto, a empresa foi achacada por dois delinquentes, não se queixou, e fez uma bela doação ao partido que, governando o país, nomeou Paulinho para uma diretoria da Petrobras. Entre 2006 e 2012 as grandes petroempreiteiras torraram R$ 856 milhões em doações para campanhas eleitorais. O PT ficou com R$ 266 milhões.

Nessa batida a coisa fica assim: os dois delinquentes que estão colaborando com a Viúva achacavam empresas e uma delas entrou na dança levada por um deputado que morreu, em benefício de um partido subsidiário. Tudo o mais seria golpismo, terceiro turno e coisa de uma elite contrariada. Já a elite lubrificada, à qual ascendeu o comissariado petista, vai bem, obrigado.

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O TAMANHO DE PRESTES

Está nas livrarias "Prestes – Um revolucionário entre dois mundos", do historiador Daniel Aarão Reis. A vida do chefe comunista, que morreu em 1990, aos 92 anos, mistura-se com a história do século 20, da esquerda e até mesmo com a da anarquia militar do período. Aarão Reis lidou com essas dimensões e mais a história pessoal às vezes trágica e amarga de um estoico. Pesquisou arquivos russos, entrevistou dezenas de pessoas e compôs um grande retrato do comandante do PCB. Prestes foi um chefe maior que seu partido. Encolheu com ele, encolhendo-o. Ao final, extinguiram-se tanto sua liderança como a importância da organização.

"Prestes" passa longe da mitologia do "Cavaleiro da Esperança". É uma biografia elegante e arduamente trabalhada. Ela acrescenta informações à vida de Olga Benário, mãe de sua primeira filha, entregue por Vargas à polícia nazista. Quando Olga veio para o Brasil era casada com um russo e tinha um filho na União Soviética. Graças a uma gravação de uma reunião do PCB, ocorrida em Praga, Aarão Reis mostra que em 1979 o debate dos "capa-pretas" estava contaminado por uma denúncia de tráfico internacional de drogas.

Aarão Reis juntou a esse cenário a vida familiar de Prestes, que teve sete filhos com sua segunda mulher, Maria, um grande personagem. A clandestinidade obrigava as crianças a chamá-lo de "Tio". Quatro delas montaram em Moscou o quarteto musical "Saci Pererê".

Prestes perdeu todas, em 1927, 1935, 1945 e 1964. Terminando-se o belo livro de Aarão Reis, fica uma pergunta: Sem ditaduras, polícias e militares a persegui-lo, de que tamanho ele ficaria?

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DIÁRIO DE MÁRCIO

Como o advogado Márcio Thomaz Bastos fixou a abertura do diário que manteve durante o tempo em que foi ministro da Justiça para 50 anos depois de sua morte, o comissariado pode pôr um teto na sua expectativa de vida tranquila:

Lula, 119 anos; José Dirceu, 118 anos; Antonio Palocci, 104 anos.

O poderoso Oxalá fez com que Márcio, um defensor das cotas raciais, morresse no dia da Consciência Negra.

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MILAGRE

Com jeito de quem não quer nada, a doutora Dilma congelou o projeto do trem bala, estimulado durante o governo de Nosso Guia. Antes que o BNDES mostrasse que a primeira proposta era fantasia em estado puro, a ideia chegou a encantá-la.

Se a coisa tivesse andado, acabaria num escandalo bilionário, parecido com o da Petrobras. Custaria no mínimo R$ 35 bilhões e já custou perto de R$ 70 milhões com nuvens, papéis e burocracia. Em benefício das grandes empreiteiras, foram elas quem pisaram no freio.

O primeiro comissário encarregado do projeto, José Francisco das Neves, ou "Doutor Juquinha", passou alguns dias na cadeia em 2012, por conta de outros malfeitos.

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TORCIDA

Há uma forte torcida para que a lista dos parlamentares apanhados pelo Ministério Público seja divulgada antes da eleição para as mesas da Câmara e do Senado.

Se for possível, o ministro Teori Zavascki poderá apressar o serviço, evitando a desmoralização do Congresso. Apesar disso, seria injusto cobrá-lo, pois lá não há bobos. Os congressistas podem não saber quem está na lista, mas sabem quem deveria estar.

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UM GABINETE DE CRISES PARA AS TARIFAS

É conhecida a piada segundo a qual os generais combatem nas novas guerras as batalhas de guerras passadas.

O palácio do Planalto criou um "gabinete de crise" para cuidar dos escÂndalos da Petrobras. Se tivesse feito isso em março, quando a Polícia Federal prendeu pela primeira vez o "amigo Paulinho", talvez pudesse ter evitado protegê-lo, considerando até mesmo "satisfatório" o acervo de patranhas que ele despejou sobre a CPI antes de decidir colaborar com a Viúva.

Se a doutora Dilma quiser criar um gabinete de crise necessário e eficaz, poderia começar a cuidar do aumento das tarifas de ônibus em São Paulo. Não é para já, mas está na agenda.

Em 2013, o prefeito Fernando Haddad baixou o aumento e foi para Paris acompanhando o governador Geraldo Alckmin. Juntos, cantaram "Trem das Onze" num evento. As manifestações contra a nova tarifa, que haviam começado mornas, viraram o que viraram.


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