Folha de S. Paulo


Aécio tem trunfos para 2º turno, mas cara a cara com Dilma não será fácil

Numa eleição já tão surpreendente desde o início, só nos faltava essa: uma guinada espetacular na véspera, literalmente, da votação e da abertura das urnas. Foi o que ocorreu. O tucano Aécio Neves, considerado fora do jogo depois da morte de Eduardo Campos, ressurgiu das cinzas e garantiu na última hora a lógica da política brasileira desde 1994, com a polarização PT-PSDB.

Entram aí as duas grandes dúvidas sobre o segundo turno que perpassaram todo o primeiro. Desde 2002, o PT ganhou do PSDB e quem chegou na liderança ganhou no final em todas as eleições de segundo turno. Está escrito nas estrelas?

O PT gostaria que sim, mas esta eleição de 2014 quebrou parâmetros, queimou a língua de muita gente e não para de produzir surpresas e novidades. Logo, não dá para dizer que "tudo será como dantes no quartel de Abrantes".

Desta vez, Dilma vence o primeiro turno num patamar bem inferior ao que Lula teve em 2002 e 2006 e ela própria atingiu em 2010. Ou seja, ela entra mais fraca.

As principais diferenças de 2014 em relação às eleições anteriores: a alta rejeição ao PT e os erros do governo Dilma Rousseff na economia. Esses dois fatores, somados, desabaram num genérico "antipetismo" que empurrou a rejeição ao PT e a Dilma a índices quase mirabolantes no principal Estado do país, São Paulo, berço tanto do PT quanto do PSDB e centro empresarial e financeiro do país. Só na capital, quase metade dos paulistanos torcem a cara ao partido.

Isso será um grande trunfo para Aécio e os tucanos no segundo turno, tanto para negociar com Marina Silva quanto para atrair os votos antipetistas. Isso, porém, não significa que o ambiente seja confortável para Aécio e que a disputa contra o PT, cara a cara, será fácil.

Dilma chegou numericamente na frente, Lula continua sendo o maior cabo eleitoral do país e o PT confirma também nesta eleição que é um partido de chegada. Ou seja: um partido que tem garra e militância e cresce na reta final.

Foi assim, por exemplo, na Bahia, no Rio Grande do Sul e no Ceará, sem contar uma vitória que tem um gosto muito especial para os petistas: a vitória de Fernando Pimentel sobre o tucano Pimenta da Veiga justamente em Minas Gerais, que Aécio Neves governou por duas vezes e onde colheu mais de 90% de aprovação.

Mesmo em São Paulo, o PT surpreendeu na reta final. Não a ponto de confirmar a "falência de material" que levaria à derrota dos tucanos, pois o PSDB continua voando muito bem, com a reeleição do governador Geraldo Alckmin em primeiro turno. Mas o suficiente para evitar um resultado que se insinuava vexaminoso.

Depois de patinar em menos de 10% ao longo de todos os meses da campanha, o candidato do PT ao governo, Alexandre Padilha, cresceu literalmente nos últimos dias e encostou no adversário Paulo Skaf, do PMDB, apesar de o tucano José Serra ter destronado o petista Eduardo Suplicy do Senado, depois de suas mais de duas décadas como senador.

A eleição, portanto, continua quente e imprevisível mesmo depois do fim do primeiro turno e muita água e muita troca de torpedos ainda vão rolar debaixo da ponte até o dia 26, quando se realiza o segundo turno.

Com a Petrobras no centro do debate cara a cara e as prisões do mensalão do PT rondando os palanques, pode apostar: o PT vai sacar algum coelho gordo e uma maldade cortante contra Aécio. Com a morte de Eduardo Campos e a disparada de Marina Silva, o PT se concentrou na "sonhática" e arquivou seus coelhos, cobras e lagartos contra o tucano. Mas eles estão soltos por aí.

Se não tiver nenhum deles concretamente, não custará muito sacar da cartola algo na linha do "o PSDB vai privatizar a Petrobras". E isso será a dias do segundo turno, sem dar tempo para a reação e o contra-ataque.

Aliás, um registro: Aécio só teve tempo para voltar do inferno ao paraíso porque a queda do Cessna foi em 13 de agosto, bem antes das urnas. Se tivesse sido um mês depois, sei não...


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