Folha de S. Paulo


Atônitos e trôpegos

ATURDIDOS, os dois candidatos à Presidência foram pegos de surpresa neste segundo turno. Lula nem sequer teve condições de aparecer no domingo à noite para agradecer e pedir votos. Alckmin se atrapalhou, horas depois, com o movimento rápido de Garotinho. Reflexo desse atordoamento comum, ambos jogaram para a próxima semana o início da campanha na TV.
O adiamento tende a beneficiar Lula. O presidente parece ter reagido com mais agilidade à nova situação e conquista a dianteira na primeira pesquisa. Inicialmente na defensiva e abatido, ele tratou de reorganizar a sua tropa e colocou a máquina oficial para trabalhar. As punições anunciadas pelo PT ontem são parte dessa estratégia.
A possibilidade real de derrota deixou transparecer um certo desespero nas hostes governistas. A sucessão de escândalos não resolvidos, originados dentro do próprio Planalto, passou a ser uma ameaça à reeleição. O dinheiro do dossiê pode ter sido apenas a gota d'água para um voto de desconfiança no governo no primeiro turno.
Buscando ativar a antiga militância, envergonhadamente ausente da cena política, Lula tenta desencavar antigos bordões contra os tucanos de plantão. Agora, o discurso oficial lembra de desastres na privatização, do caos na segurança, de falcatruas abafadas.
Para seduzir eleitores, Lula diz que seu adversário vai demitir e encolher os programas assistencialistas. Mais explícito do que Alckmin, defende com fervor os lucros sempre crescentes dos bancos -marca desta e da gestão tucana, item intocável na economia.
Incapaz de mostrar uma estatura de estadista, o tucano se enrosca nas politicagens paroquiais e derrapa na costura de alianças. Cercado por conservadores inexpressivos, ele provoca perplexidade entre seus pares no PSDB e, a julgar pela primeira pesquisa, perdeu tempo e não ganhou velocidade.
Passada a euforia inicial, Alckmin, que parece considerar a si próprio um iluminado e predestinado, deve estar vivendo momentos de angústia. Para virar o jogo, de fato, vai precisar, além da sua obstinação, do apoio daqueles que não queriam vê-lo no segundo turno e o consideram um estranho.
Como Lula, o ex-governador procurará transformar o segundo turno numa peleja entre o diabo e o dono do céu. Alckmin vai querer mostrar a foto da dinheirama e empunhar a bandeira da ética. Resta saber se, com seu jeito Daslu de ser, conseguirá convencer. Para alguns aliados, ele já foi longe demais.
Tranqüila, a elite assiste da arquibancada ao confronto. Para ela, a vida está ganha com qualquer resultado. Não há ameaças à vista, e o segundo turno é só mais um passeio "com emoção".


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