Folha de S. Paulo


Mulheres que choram

EMOCIONADAS, elas parecem protagonistas do horário eleitoral dos principais candidatos. Penhoradas, choram após um sorteio de casas, um parto difícil, uma doação de remédio. Fiéis, festejam a vaga do filho na faculdade, a chegada da luz, o Bolsa-Família.
Assim, entre lágrimas e explosões de alegria, PT e PSDB expõem igualmente o seu "lado social". Paternalismo e assistencialismo se somam. As benesses são mostradas como uma concessão pessoal dos governantes. Resta às mulheres agradecer o favor e votar.
Amplificadas na TV, as migalhas "sociais" tentam seduzir o eleitor. Não se fala do real programa de transferência de renda do país: a política de juros, que amarra o desenvolvimento e bombeia riqueza da sociedade para bancos, empresas e famílias rentistas.
Esse programa -que, no passado, foi travestido de inflação- mantém a desigualdade abissal de renda e iguala o desempenho dos ditos sociais-democratas e dos liberais autodenominados de esquerda. Ambos constroem uma cortina de fumaça para separar a política "social" da política econômica. São indissociáveis.
Os dois partidos se empenham há 12 anos em desmontar os freios legais para a concentração de riqueza. Salário mínimo e previdência social, por exemplo, exercem esse papel "social" com mais profundidade do que qualquer auxílio emergencial (eleitoral) e focado.
Esmolas como o Bolsa-Família podem ter alguma importância em período eleitoral. Mas, em razão das verdadeiras prioridades econômicas, tendem a encolher e a não modificar o panorama social. Os números oficiais de concentração de renda -que mostram, eventualmente, alguma melhoria homeopática- só medem os ganhos do trabalho e omitem o mundo dos beneficiados pelos juros.
A média de crescimento nesses anos ficou abaixo dos 3%. O Brasil patina mesmo quando o mundo avança a taxas quase chinesas. Como no governo anterior, a gestão econômica fere a industrialização, decepa os empregos e deixa o país dependente de commodities.
Ninguém apresenta um projeto alternativo consistente. Aparecem só estridências eleitorais ocas. Boa parte das elites (econômica e intelectual) há muito se rendeu à lógica da fuga para Miami. Abdicaram de discutir o futuro do país. Afinal, está tudo "dominado" -e rendendo bem no banco.
A disputa é entre iguais nesta eleição. Se as personalidades são diferentes (um líder domesticado e carismático contra um executivo racional e fundamentalista), os projetos são irmãos. Não ousam mexer em interesses estabelecidos. Basta conferir quem se beneficiou nos anos tucano-petistas.
Os rentistas são os verdadeiros protagonistas desta história. E eles não choram no horário eleitoral.


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