Folha de S. Paulo


Escolhas, razão e emoção

Um amigo dos tempos de escola telefona para tirar uma dúvida: deve comprar um sedã médio ou um utilitário esportivo? Ele explica que foi contemplado em um consórcio, fala que fez pesquisas em diversas concessionárias e pede opinião sobre dois modelos da mesma marca.

O primeiro é um sedã médio que custa R$ 68 mil. O segundo, um SUV parrudo de R$ 89 mil.

Engenheiro e advogado, ele usa argumentos cartesianos para falar do três volumes: espaçoso, econômico, desenho agradável, apelo jovial, seguro mais barato etc.

O utilitário esportivo foi elogiado pelo bom acesso ao porta-malas, versatilidade, altura do solo, maior sensação de segurança e percepção de valor. "Parece mais carro", disse ele, que hoje é proprietário de um hatch médio com quatro anos de uso e baixa quilometragem.

Suas explanações eram desnecessárias, bem como a minha opinião, pois a decisão parecia ter sido tomada antes do telefonema: meu amigo vai levar o utilitário.

Uma simples dúvida sobre qual carro comprar não custa R$ 21 mil, que é a diferença de valores entre os modelos em questão. Esse é o preço de realizar um sonho de consumo, e não há nada racional nisso. Ele só precisava de alguém para avalizar sua decisão.

Assim que estiver com o veículo na garagem, vai mostrar o quanto é fácil colocar o carrinho de bebê do filho que ainda não teve no bagageiro. Vai falar também de como o carro é alto e robusto para enfrentar estradas de terra pelas quais nunca passará.

Daqui a três ou quatro anos, quando ele resolver trocar de carro, o fogo da paixão terá arrefecido e virá o desejo pelo novo.

Talvez o filho planejado já tenha nascido, e espaço continue sendo uma prioridade. Mas haverá outros automóveis, mais modernos e bonitos, desses que fazem os aficionados suspirarem.
Nessa hora, o telefone irá tocar novamente.


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