Folha de S. Paulo


A origem do mal

Os anúncios espalhavam-se pelas páginas de classificados de alguns dos principais jornais do Brasil. Na maioria dos casos, traziam uma pequena foto do carro, meramente ilustrativa. Os preços vinham em destaque, pechinchas irresistíveis.

Nos cantos da publicidade, destaques em formato de estrela exibiam as facilidades. Financiamento sem entrada em 48, 60 ou 72 parcelas fixas.

Nas letras miúdas do rodapé, o aviso: "Valores válidos para compras mediante financiamento nas condições anunciadas".

O cliente ia à loja e descobria que o valor para pagamento à vista seria maior que o anunciado para a compra em prestações. Eram os tempos do "fator de retorno", em que não se vendiam carros, mas, sim, financiamentos.

As tabelas traziam taxas variáveis para um mesmo tipo de crédito, e as financeiras ofereciam benefícios a quem vendesse veículos aplicando as tarifas mais elevadas.

A margem de lucro era garantida pelo banco, e os comerciantes compensavam os descontos anunciados empurrando as taxas mais elevadas para consumidores desavisados.

Era fácil conseguir crédito. Se a renda fosse baixa, juntava-se o comprovante ao de um parente próximo e o negócio era aprovado. Em casos assim, a taxa era ainda mais elevada -afinal, esse era um consumidor "de risco", candidato à inadimplência.

Não vai longe o tempo em que isso ocorria. A prática começou a ser coibida pelo Banco Central há três ou quatro anos. Mas o mal já estava feito.

O tempo passou, as prestações já não cabiam no bolso, carros foram perdendo valor e deixando de ser pagos. O crédito começou a minguar, o mercado entrou em recessão, o governo interveio e as vendas decolaram.

Agora, a comercialização de automóveis novos e usados está em declínio, e a reação do crédito é tímida. O mal ainda habita entra nós.


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