Folha de S. Paulo


Doping russo vira desafio para cartolagem do COI

A Olimpíada de Inverno, em fevereiro, será o próximo grande momento do esporte mundial. A grandiosidade do evento, no entanto, corre o risco de ser ofuscada por um grave entrave, o da elegibilidade dos atletas da Rússia, que se arrasta desde que foi desmascarada a política criminosa de doping que vinha sendo aplicada naquele país.

Uma decisão sobre esse conflito deve surgir no início de dezembro, em reunião do COI (Comitê Olímpico Internacional). Posicionar-se sobre a delicada questão é um enorme desafio para a entidade que reúne comitês de 206 países.

A Rússia continua encurralada, pressionada pela repercussão do escândalo, escancarado a partir do final de 2014, quando o canal público de TV alemão ARD revelou que o país usava um esquema de substâncias ilegais no esporte.

Agências antidoping, que representam 17 bandeiras, entre as quais a dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, encaminharam solicitação ao COI para que a Rússia fique fora dos Jogos de Inverno, em PyeongChang, na Coreia do Sul.

Detalhes da trambicagem, cada vez mais robustos, vieram à tona rapidamente. As investigações resultaram em documento da Wada (relatório McLaren), que apontou um sistema de doping com participação do Estado, repercussão em 30 esportes de 2011 a 2015 e ajuda até dos serviços secretos do país.

O governo russo reagiu com negativas sobre a existência do esquema, mas a trapaça ficou exposta. Inclusive, tinha deixado rastros no Mundial de Atletismo de Moscou-2013 e na Olimpíada de Inverno de Sochi-2014.

O posicionamento mais duro dos países sobre o pedido de veto à Rússia nos Jogos de PyeongChang certamente é uma resposta aos acontecimentos do evento em Sochi.

Na Olimpíada do Rio, ano passado, o atletismo russo foi impedido de participar, enquanto atletas de outras modalidades puderam se inscrever desde que com aval das respectivas federações internacionais. Foi uma medida paliativa para superar aquele momento.

Com a crise, dois membros da Federação Internacional de Atletismo, investigados por corrupção, renunciaram aos cargos. Foram eles Valentim Balakhnichev, presidente da federação russa e tesoureiro da IAAF, e Papa Massata Diack, consultor de marketing da IAAF e filho do então presidente da entidade, Lamine Diack.

Para o Brasil, um episódio que será repetidamente lembrado. Isto porque Papa Massata é também destacado personagem nas denúncias sobre suspeitas de compra de votos em 2009 para que a Olimpíada-2016 tivesse o Rio como sede.

A Wada (Agência Mundial Antidoping), segundo reportagem do "New York Times" publicada nesta Folha, concordou em liberar 95 dos primeiros 96 atletas russos cujos casos foram revisados por ela.

Um diretor da Wada disse ao jornal que as "provas disponíveis são insuficientes" para sustentar a violação das regras por aqueles atletas, mas não identificou nenhum deles.

Caso o COI ratifique conclusões da Wada nesse sentido, vai ser uma alívio para o Comitê Olímpico da Rússia, que ficará com o caminho livre para que seus atletas possam competir em PyeongChang. Talvez mediante o pagamento de uma simples multa.

A exclusão da Rússia dos Jogos pode até ser uma medida drástica demais, mas uma multa também é pouco, depois de tanta investigação e anúncio de provas. O desfecho de investigação de crime no esporte sempre tem final embaralhado. Nunca é transparente, embora seja fértil para estimular a imaginação.


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