Folha de S. Paulo


Suspeita de propina olímpica é duro golpe na imagem do Brasil

Ricardo Moraes/Reuters
Nuzman chega à Polícia Federal para prestar depoimento
Nuzman chega à Polícia Federal para prestar depoimento

As emoções do futebol brasileiro estão vivas com as disputas da Copa Sul-Americana, Libertadores, Copa do Brasil, Campeonato Brasileiro e as apresentações da seleção do Tite, a primeira do mundo a garantir vaga na Copa da Rússia.

Apesar disso, o esporte nacional está rendido, cada vez mais atolado em denúncias de corrupção. Aparenta, no momento, fraqueza para uma reação diante do enorme tamanho dos escândalos.

As tramoias da cartolagem, que sempre atrapalharam a evolução dos esportes –futebol a paixão nacional e olímpicos–, cresceram de forma desenfreada nos últimos anos, acompanhando o galope dos desajustes e crimes vergonhosos praticados na política e em conluio com empresários desonestos.

Corruptores e corrompidos são farinha do mesmo saco, piores ainda quando se valem do chamado "instituto de delação". Em outras palavras, réus confessos e traidores. A traição, no caso, é apenas para obter vantagem pessoal, sem nenhum outro propósito. Existe algo mais repugnante?

Nos esportes, como na política, a prática de irregularidades não é novidade. Entretanto, alcançou níveis insuportáveis com os preparativos para a Copa do Mundo de futebol no Brasil, embora a competição em si tenha transcorrido em paz e sem incidentes.

A mídia nacional revela continuamente a podridão do que foi o funcionamento da indústria da propina e do superfaturamente de projetos daquele Mundial.

A derrota por 7 a 1 diante da Alemanha não passou de vexame esportivo, um tropeço com certo exagero, mas de jeito nenhum motivo de vergonha para quem quer que seja. Já as maracutaias, como as da construção de estádios, superfaturados e verdadeiros elefantes brancos, ofendem o contribuinte.

Superada a etapa da Copa, mesmo envolvido por sérios problemas sociais, econômicos e políticos, o Brasil cumpriu outro compromisso internacional que havia assumido no tempo das vacas gordas da economia nacional, o de organizar a primeira Olimpíada na América do Sul.

O evento foi um sucesso, como o do Mundial de futebol. Mas a fatura chegou e repete a trajetória do malogro da Copa.

Na verdade, a desventura não causa surpresa. O gigantismo do projeto olímpico exigia transparência e responsabilidade para que a sua execução fosse perfeita e impedisse qualquer tipo de desvio. Não foi bem assim. Além disso, o anunciado legado olímpico patina, com enorme chance de naufragar.

Não bastassem tais fatos, a Justiça francesa deu um passo a mais nas investigações sobre suspeita de possível compra de votos do Rio para ganhar o direito de abrigar os Jogos Olímpicos.

A denúncia, revelada em março pelo jornal francês "Le Monde", foi abordada aqui naquela oportunidade. Inicialmente, as investigações visavam a compra de votos por Tóquio-2020, também denunciada, e acabaram chegando ao Rio.

Carlos Arthur Nuzman, presidente do COB (Comitê Olímpico do Brasil) e do comitê organizador da Olimpíada do Rio-2016, foi intimado na terça passada (5) a depor na sede da Polícia Federal do Rio sob suspeita de participação no esquema daquela compra de votos.

Ele ainda não se manifestou publicamente sobre o caso, mas já tomou conhecimento dos termos da denúncia. Na residência de Nuzman, os policiais apreenderam R$ 480 mil em moedas estrangeiras e os passaportes brasileiro e russo do cartola que tem dupla nacionalidade.

A intimação é parte da Operação Unfair Play ("Jogo Sujo"), deflagrada pela PF, com o objetivo de prender Arthur Menezes Soares, o "Rei Arthur" (até o fim da tarde desta segunda continuava foragido), e Eliane Cavalcante, sócios de empresa de fornecimento de mão-de-obra para o governo do Rio. Cavalcante foi presa.

Soares é suspeito de ter repassado propinas do ex-governador do Rio Sérgio Cabral a um dirigente do Comitê Olímpico Internacional para garantir votos de países africanos, em 2009, na escolha da sede olímpica de 2016, que ficou com o Rio.

O Ministério Público Federal pediu o bloqueio de R$ 1 bilhão de contas de Nuzman e dos outros suspeitos para pagamento de danos morais coletivos e pelo estrago à imagem do Brasil no mundo. Quanto vale um crime dessa extensão? Não tem limite, creio.


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