Folha de S. Paulo


Uma longa corrida olímpica

Uma corrida de poucos e poderosos concorrentes, e que vai se alongar pelos próximos dois anos, tem início para definir a anfitriã da Olimpíada de 2024.

Paris, Los Angeles e Roma, que já abrigaram os Jogos tempos atrás, despontam como as principais forças diante da alemã Hamburgo e de Budapeste, a capital da Hungria.

Essas são as cinco candidatas. Embora confirmada, a candidatura de Hamburgo ainda vai ser avaliada pela sua população em um referendo previsto para 29 de novembro. A mais frágil das pretendentes é Budapeste, sem tradição na organização de eventos esportivos internacionais de grande porte.

Baku, capital do Azerbaijão, que organizou em junho os Jogos Europeus, chegou a estudar com o COI a possibilidade de entrar na disputa. A conclusão foi que uma candidatura olímpica pode ser mais oportuna no futuro, após avaliações mais detalhadas.

Outra que desistiu, mas chegou a estudar as chances de se lançar no desafio foi a canadense Toronto, empolgada com os Jogos Pan-Americanos, que promoveu recentemente. O Canadá sabe muito bem dos prós e contras. Conviveu com a experiência de Montrèal-1976, quando foram necessários anos e anos de arrecadação de impostos para quitar os débitos provocados pelo evento.

As cidades que tiveram suas propostas oficializadas pelo Comitê Olímpico Internacional permanecerão na disputa até o final porque os regulamentos foram reformados, eliminando a fase eliminatória. A votação definitiva ocorrerá no segundo semestre de 2017, em Lima, no Peru.

Algumas das concorrentes têm histórias curiosas relacionadas ao evento, especialmente aquelas que já o promoveram. Paris, por exemplo, foi a sede em 1900 já com a torre Eiffel na paisagem, e os Jogos sendo uma deferência ao seu idealizador na Era Moderna, o barão francês Pierre de Coubertin. Na edição de 1924, com 44 nações, a cidade registrou recorde de participantes.

Los Angeles também abrigou os Jogos em duas oportunidades. A primeira, em 1932, após três anos da quebra de Bolsa de Nova York e da Grande Depressão. Depois, em 1984, quando o evento sofreu o boicote dos países do Leste europeu, liderados pela ex-URSS, que havia experimentado atitude semelhante dos norte-americanos e aliados quatro anos antes, em Moscou. Os EUA, principal potência olímpica, organizaram ainda outra Olimpíada, a de Atlanta-1996, onde uma bomba explodiu e deixou vítimas.

Roma, em 1960, foi a primeira ex-aliada de ponta da Alemanha nazista na Segunda Grande Guerra a receber a Olimpíada –quatro anos depois seria a vez de Tóquio. Aqueles Jogos foram palco de um fato que se revelaria corriqueiro, e repugnante, no ciclismo e no esporte em geral: o doping. Um atleta dinamarquês, Knud Jensen, morreu ao término da prova de estrada. A autópsia apontou uso de estimulante.

Tem ainda Hamburgo, cidade da Alemanha, país com duas Olimpíadas polêmicas no currículo, a de Berlim-1936, sob o regime nazista e com Adolf Hitler na tribuna do estádio, e, Munique-1972, cenário do trágico massacre dos atletas de Israel, mortos por palestinos.

Com essa concorrência para escolha da sede dos Jogos de 2024, o COI inaugura também uma nova etapa. É que passa a vigorar integralmente a Agenda 2020, aprovada no ano passado, com medidas mais viáveis e facilidades para propostas de candidatura. A principal meta é a redução dos custos.

Nas últimas duas décadas, o gigantismo que tomou conta dos Jogos se transformou em barreira e desestímulo para candidaturas. A Olimpíada de Inverno, por exemplo, em sua disputa recente, tinha apenas duas concorrentes para 2022, a vencedora Pequim, na China, e Almaty, no Cazaquistão.

As novas regras, entre outras coisas, permitem o aproveitamento de construções existentes e o uso mais amplo de instalações temporárias. A ideia é dar flexibilidade e diversidade para que as cidades interessadas apresentem planos que se encaixem em seu planejamento social, econômico, ambiental e desportivo.

Com essa abertura, as candidaturas certamente incluirão em seu dossiês palcos utilizados em Jogos passados ou em grandes eventos esportivos internacionais. Avaliações públicas também foram levadas em conta.

Nos últimos tempos, arautos dessas candidaturas ressaltaram valores artísticos, históricos e culturais, além de belezas naturais, das cidades. Nenhum deles abordou dificuldades ou problemas, como escândalos de corrupção e questões de ordem financeira. Até a chegada de milhares de imigrantes na Alemanha foi avaliada pelo prefeito de Hamburgo, Olaf Scholz, como um sinal da reputação receptiva do país.

Eric Garcetti, prefeito de Los Angeles, disse que pode organizar Jogos rentáveis. Mas teve de garantir ao conselho municipal –que aprovou por unanimidade ativar a candidatura– não exceder os custos potenciais para o evento, fato corriqueiro em se tratando de Olimpíada, nem comprometer os contribuintes com gastos futuros.

Será o prefeito um precursor na política, que promete e cumpre? O tema é controverso. Parece mais uma daquelas histórias para boi dormir.


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