Folha de S. Paulo


Ministro mexicano da Fazenda disputa Presidência, sonho do colega Meirelles

Henry Romero - 27.nov.2017/Reuters
José Antonio Meade, após renunciar à secretaria de Fazenda e virar candidato presidencial no México
José Antonio Meade, após renunciar à secretaria de Fazenda e virar candidato presidencial no México

Deu esta semana em "El País":

"Com sua possível candidatura presidencial, o partido procurar lavar a face e distanciar-se da corrupção e dos altos índices de violência, (...) dois assuntos que monopolizarão a eleição de 2018".

Está falando do Brasil e de Henrique Meirelles, certo? Parece, até serve para ambos, mas trata-se de reportagem sobre a candidatura de José Antonio Meade à Presidência do México em 2018, três meses antes do pleito brasileiro.

Meade é claramente o Meirelles mexicano. Acaba de deixar o comando da economia exatamente para se candidatar à Presidência pelo partido do governo, o PRI (Partido Revolucionário Institucional). Aliás, há até alguns (poucos) pontos de contato entre o PRI e o PMDB: este aparece no governo desde a redemocratização, embora quase sempre como mero figurante. Já o PRI governou o México ininterruptamente desde 1929 até 2000, quando finalmente foi derrotado em duas eleições consecutivas pelo conservador PAN (Partido de Ação Nacional). Voltou ao poder em 2012.

Meade, como Meirelles, só tem um ativo a impulsionar sua candidatura: a estabilidade da economia.

Comparte com o ministro brasileiro outra característica: foi ministro também no governo anterior, de Felipe Calderón, de oposição ao PRI (ao qual, aliás, não é filiado, assim como Meirelles é do PSD e não do PMDB de Temer). Meade foi ministro da Fazenda e da Energia —assim como Meirelles comandou o Banco Central em todo o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Há mais um elemento a unir os dois presumíveis candidatos: tanto Meirelles como Meade têm, em princípio, o apoio dos agentes de mercado, ou pelas suas qualidades intrínsecas ou, o que é mais provável, pelo medo de um fantasma.

No México, o fantasma chama-se Andrés Manuel Lopéz Obrador, mais conhecido pelas iniciais AMLO. É o Lula mexicano, por estar à esquerda dos demais partidos do establishment e por ser renitente candidato presidencial: perdeu nas eleições de 2006 e 2012, mas não reconheceu a derrota.

Difere de Lula por dois lados: passou pelo PRI e pelo PRD (Partido Revolucionário Democrático, dissidência pela esquerda do PRI) e acabou criando um movimento próprio, o Morena (Movimento de Regeneração Nacional). Lula, ao contrário, foi a vida toda do PT.

Voltam a coincidir no fato de que ambos lideram as pesquisas, com mais folga no caso de Lula. López Obrador tem 25% contra 19% do PAN e 16% do PRI, na mais recente pesquisa, do jornal "El Universal".

AMLO parece ter aprendido com Lula a lição de que radicalismo raramente ganha eleição, ao menos na América Latina. Sempre tido como esquerdista empedernido, López Obrador divulgou há pouco a sua própria versão da "Carta ao Povo" (no caso, o mexicano), na qual defendeu o direito à propriedade privada e afastou os receios de que trataria de nacionalizar ativos ou indústrias, além de garantir que as contas públicas seriam gerenciadas responsavelmente por seu governo (essa garantia era um dos eixos fundamentais da "Carta ao Povo Brasileiro").

Tantas semelhanças tornam interessante acompanhar a campanha mexicana, que já tem a sua novidade, na figura de Meade. Se decolar, seria um estímulo extra para o apetite de Meirelles.


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