Folha de S. Paulo


Temer fica, mas mais frágil como pessoa física e presidente

Michel Temer voltou duas vezes nesta quarta-feira (25): a pessoa física teve alta, depois de um episódio (necessariamente agudo) de caráter urológico; e o presidente da República teve alta da Câmara para voltar ao Palácio do Planalto com a certeza de que ganhou o "fica, Temer".

Mas tanto a pessoa física como o presidente voltam mais fracos.

Por pequeno que seja o problema urológico, sempre debilita uma pessoa, ainda mais quando ela tem 77 anos, como Temer, e está em tratamento clínico de um problema cardíaco.

No caso do presidente, a debilidade havia sido medida pelo Datafolha antes da votação da segunda denúncia contra Temer: ele começara o mandato (o definitivo) com 14% de ótimo/bom, o que já era insignificante. Perdeu dois terços e ficou no mais recente levantamento com apenas 5%.

Era inevitável que os deputados que deveriam decidir sua sorte tivessem presente esse declínio na popularidade presidencial, tanto que o governo teve que promover uma autêntica xepa na feira fisiológica que marcou todo o processo.

Xepa para assegurar não a rejeição da denúncia, o que era inevitável, dada a maioria que o governo detém na Câmara, mas, simplesmente, para que os deputados dessem o quórum para que a votação fosse iniciada.

Posto de outra forma: foram necessárias cenas explícitas de fisiologia para que os deputados simplesmente cumprissem o elementar dever de trabalhar e, no caso dos governistas, de votar a favor do governo.

Não estava nem nunca esteve na pauta a análise jurídica da denúncia contra Temer. O que valeu, tanto na primeira como na segunda votação, foi o interesse dos parlamentares em manter Temer na Presidência, independentemente das acusações contra ele, pela simples e boa razão de que o presidente se tornou refém do Congresso, exatamente pela sua fragilidade.

Fragilidade, de resto, evidenciada pela redução no número de votos pró-Temer, na comparação com a votação da primeira denúncia: 233 agora x 262 antes.

A questão seguinte relevante é esta: Temer tem condições para anabolizar o seu governo? Ou, ao contrário, ficará condicionado por uma espécie de parlamentarismo branco, que, de certa forma, reproduziria o que houve no governo José Sarney (1985-90)?

Sarney, presidente acidental (pela morte do titular, Tancredo Neves), dependia muito para governar da boa ou má vontade de Ulysses Guimarães, presidente da Câmara e do PMDB, então fortemente majoritário.

ULYSSES

Há, no entanto, uma diferença fundamental: Ulysses tinha uma dimensão política imensamente superior à de Rodrigo Maia, o atual presidente da Câmara, político menor, mas que começa a se insinuar como candidato a ser o homem forte da etapa final do presente governo.

A coalizão que conspirou para derrubar Dilma Rousseff e, por extensão, entronizar Temer não fulaniza a sua agenda liberal. Para os agentes de mercado -peças fortes da coalizão -, tanto faz quem vai conduzir a agenda. O importante é mantê-la, ainda que desidratada.

Para a grande maioria dos congressistas, que são a segunda perna da coalizão, a agenda torna-se aceitável sob duas condições: uma, a de que seu apetite fisiológico seja saciado; outra, a de que as reformas liberais não sejam tão impopulares que votar por elas os leve à não serem reeleitos.

Tais condições em tese inviabilizam reformas que tenham o vigor desejado pelos agentes de mercado.

Salvo surpresas, portanto, Temer salvou-se apenas para entrar na senda da mediocridade que marcou o final do período Sarney, ambos presidentes acidentais.


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