Folha de S. Paulo


O 'b' dos Brics ficou minúsculo

Fred Dufour/AFP
Jornalistas conversam no centro de mídia da cúpula dos Brics, que começa neste domingo em Xiamen
Jornalistas conversam no centro de mídia da cúpula dos Brics, que começa neste domingo em Xiamen

Na sigla Brics, que promove neste domingo (3) a sua nona cúpula, o "b" deveria ser minúsculo porque o Brasil de Michel Temer encolheu desde que o acrônimo foi criado em 2001, aliás por uma entidade financeira (Goldman Sachs) e não pelos governos que dele fazem parte (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

A culpa pelo encolhimento, diga-se, é mais de Dilma Rousseff do que do próprio Temer, mas ele não fez quase nada para encorpar o país.

No campo diplomático, a demonstração do encolhimento aparece com total nitidez quando se compara a realidade atual com a descrição do que se imaginava para os Brics feita pelo diplomata João Carlos Silvestre Fernandes.

Seu texto integra o livro "Os desafios e oportunidades na relação Brasil/Ásia na perspectiva de jovens diplomatas". Trata-se de uma coletânea que demonstra que, pelo menos no Itamaraty, ainda há gente pensando o Brasil.

João Carlos lembra que os grandes emergentes —caso dos países que integram os Brics— "passaram a ocupar um novo lugar no sistema internacional; com maior poder de barganha em negociações, maior influência sobre questões regionais e mundiais, e capacidade e disposição para agir de forma proativa e propositiva onde antes o Sul Global esteve reduzido a papéis meramente passivos ou reativos".

Não é preciso ser especialista em relações internacionais para saber que, nos últimos anos, o "b" dos grandes emergentes a) perdeu poder de barganha em negociações ou, no mínimo, não ganhou mais poder; b) tampouco influi mais em questões regionais e mundiais; e c) não demonstra nem capacidade nem disposição para agir de forma proativa e propositiva [no cenário internacional; aliás, nem regional].

Na economia, o encolhimento é visível na comparação com o crescimento dos pares nos Brics de 2010 a 2016: o Brasil cresceu apenas 2%, menos que a Rússia (6%), a África do Sul (12%) e, naturalmente, Índia (48%) e China (56%), os grandes emergentes que mais crescem.

Fica evidente que o Brasil não está contribuindo para que os Brics se tornem as grandes potências mundiais em 2050, conforme a previsão inicial da Goldman Sachs, posteriormente antecipada para 2030.

Aliás, nos dois últimos anos, o Brasil só faz atrapalhar a já discutível concretização da aposta de Jim O'Neill, então economista-chefe da Goldman Sachs.

Se serve de consolo, não é apenas o Brasil que teima em contradizer a previsão de O'Neill. A realidade também o faz: os Brics ainda são um conjunto de países pobres, na comparação com a turma do G20. Só a Rússia tem renda per capita acima da média desse grupo de grandes economias.

Em números absolutos, só a Indonésia, entre os do G20, tem renda per capita inferior aos dos Brics, excetuada a Rússia. Esta supera também Argentina, México e Turquia —o que, convenhamos, não é uma proeza extraordinária.

Tudo somado, Michel Temer pode não ficar tão invisível nos Brics como na cúpula do G20, mas o 0,2% de crescimento no segundo trimestre está longe de bastar para anabolizar o "b".


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