Folha de S. Paulo


Populismo testa força na Argentina, no que pode ser prelúdio para o Brasil

Cristina Fernández de Kirchner, a mais recente encarnação do poderoso populismo argentino, pode ganhar as primárias deste domingo (13), o que marcaria seu retorno ao primeiro plano do cenário político apenas 20 meses depois de não conseguir fazer seu sucessor na eleição presidencial.

Se vencer, o efeito não será só interno. Guardadas as diferenças com o Brasil, pode ser o prelúdio de um retorno semelhante do populismo no pleito de 2018, seja Luiz Inácio Lula da Silva ou algum outro que represente esse multifacetado movimento rotulado como populista.

Marcos Brindicci - 20.jun.2017/Reuters
A ex-presidente argentina Cristina Kirchner acena a seus seguidores ao lançar candidatura ao Senado
A ex-presidente argentina Cristina Kirchner acena a seus seguidores ao lançar candidatura ao Senado

Cristina está na frente, com pequena margem, é verdade, nas pesquisas sobre as Paso (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), uma espécie de avant-première da eleição propriamente dita (no caso, o pleito legislativo marcado para outubro, que elege um terço do Senado, ou 24 cadeiras, e 127 deputados, do total de 257).

A Paso não elege ninguém; apenas define que partidos podem concorrer às eleições e quem, em cada partido, pode ser candidato. Só as agrupações que obtém 1,5% dos votos participam da eleição real.

Ou seja, mesmo que Cristina, candidata ao Senado, seja a mais votada nas primárias, nada garante que será eleita em outubro (e menos ainda garante que possa se eleger presidente em 2019).

Mesmo assim, sua vitória nas primárias terá "alto impacto negativo" para o governo do presidente Mauricio Macri, conforme analisa Luis Majul, colunista de "La Nación": "impacto negativo que poderia repercutir, dentro e fora do país, na economia real, nas finanças, entre os investidores estrangeiros e nos mercados".

É a partir dessa constatação que cabe traçar certo paralelismo com o Brasil. Macri e Michel Temer substituíram presidentes ditos populistas e estão tratando de implementar agendas liberais, como contraponto ao intervencionismo de suas antecessoras. São essas agendas contrapostas que disputarão os eleitores, no Brasil como na Argentina.

Por enquanto, a agenda Macri oferece resultados pobres, na comparação com os números de Cristina em seu último ano (2015): a renda per capita argentina recuou dos US$ 14.854 de 2015 para US$ 12.507 em 2016; o desemprego pulou de 7,1% para 8,4%, nos mesmos anos; e a inflação, de 26,9% para 41%.

A economia, que crescera 2,6% em 2015, retrocedeu 2,2% no ano passado. Mas, neste ano, está crescendo (a Cepal prevê um avanço de 1,1%, magro, mas avanço).

Claro que atribuir os maus resultados a Macri é falácia; parte dos maus resultados decorre da correção dos problemas legados por Cristina. Mas para a grande maioria dos eleitores o que importa não é a explicação científica de seus males e sim as dores que sente no bolso.

No caso do Brasil, por exemplo, não importa que a maior parte dos desempregados seja um legado do governo Dilma; importa que Temer não está conseguindo reduzir o desemprego substancialmente —o que ajuda a explicar sua baixíssima popularidade.

O fato é que as primárias deste domingo na Argentina medirão a força do populismo, esse eterno personagem, lá como no Brasil.


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