Folha de S. Paulo


Suíça vota a obsessão de Suplicy

Eduardo Matarazzo Suplicy não está sozinho na sua obsessão por implantar a Renda Básica da Cidadania, um salário pago pelo governo a todo cidadão, empregado ou desemprego, rico ou pobre.

O ex-senador chegou a ser injustamente folclorizado por seu empenho na proposta, tão obsessivo que aceitou esperar humilhantes três anos para poder discuti-la ao vivo com a presidente Dilma Rousseff. Ela só o recebeu depois de afastada (na quarta-feira, 1) e, portanto, sem poder para implantar o esquema, que já é lei desde 2004, mas continua esperando regulamentação.

Enquanto o pobre Brasil aguarda, a rica Suíça vota neste domingo (5) se adota ou não a RBU (Renda Básica Universal), como é chamada por lá.

O projeto suíço estabelece um salário de 30 mil francos suíços ao ano (R$ 109 mil) e, prevê o "Financial Times", será fragorosamente derrotado. E, mesmo que vença, acabará na mesma geladeira em que está a proposta brasileira, porque os 26 cantões suíços - os encarregados de implementar o mecanismo - resistirão a ele.

Não importa, como constata o próprio "Financial Times": "O simples fato de que um dos mais países mais prósperos do mundo está realizando essa votação ressalta como um secular sonho de pensadores radicais está se infiltrando na corrente principal da política".

Tanto está que outros dois países prósperos da Europa (Finlândia e Holanda) ensaiam testar um mecanismo mais limitado, pelo qual alguns cidadãos (mas não todos) passariam a ter direito a um salário mensal de cerca de €1,000 (R$ 4 mil).

Outro sinal dessa "infiltração": a Fundação Jean Jaurès, ligada ao Partido Socialista francês (no poder na não menos próspera França), acaba de divulgar proposta similar à que será votada na Suíça.

O estudo fez simulações com diferentes valores, entre € 500 e € 1 mil. Se adotada a simulação intermediária (€ 750 ou R$ 3 mil) por mês, custaria 26% do PIB (Produto Interno Bruto), que "poderia ser financiado pela reorientação das despesas atuais de proteção social (aposentadoria, seguro-doença, desemprego, alocações familiares, por exemplo)".

Para os autores do estudo, "uma reforma como essa constituiria uma revolução de alcance similar à criação da Seguridade Social em 1946".

Se o plebiscito deste domingo na Suíça fosse realizado em toda a Europa, o resultado seria o contrário do que o Financial Times prevê para a Suíça: segundo o semanário alemão "Der Spiegel", 64% dos europeus votariam a favor, segundo a maior pesquisa sobre o assunto realizada até agora na Europa. Votos seguros contra seriam apenas 24%.

Mais de 10 mil cidadãos dos 28 países da União Europeia foram ouvidos.

É razoável supor que uma das razões para um resultado como esse é a divulgação de um estudo sugerindo que 47% das funções hoje executadas por humanos poderão ser automatizadas nas próximas duas décadas.

Sem emprego, sem salário, a menos que a renda básica seja introduzida.

É essa utopia que vai a voto neste domingo em um país em que pobreza é palavra quase desconhecida.


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