Folha de S. Paulo


Tsipras-2015 é o Lula-2002

A eleição deste domingo, 25, na Grécia lembra a do Brasil em 2002, com Alexis Tsipras, candidato do Syriza (Coligação de Esquerda Radical) no papel de Luiz Inácio Lula da Silva.

Como alguns talvez ainda se lembrem, boa parte do establishment brasileiro, em especial os agentes de mercado, ameaçaram o Brasil com o derretimento se Lula ganhasse a eleição.

Emblemática foi a posição expressa à Folha pelo megainvestidor George Soros, para quem ou José Serra, então o candidato oposto a Lula, ganhava o pleito ou seria o caos.

A ameaça repete-se na Grécia de 2015, com uma agravante: o que se diz nos mercados é que a Grécia será simplesmente expulsa do euro, a moeda única de 18 países europeus.

Tudo porque Tsipras propõe rediscutir a dívida grega, rejeitar a austeridade e adotar um pacote de gastos sociais, rebatizados para "humanitários", pela simples e boa razão de que a austeridade provocou uma crise humanitária sem precedentes.

As ameaças parecem não surtir efeito, como não surtiram no Brasil, tanto que Lula ganhou a eleição com alguma folga.

Na Grécia, o Syriza aumentou sua vantagem nas pesquisas de 3 para algo em torno de 4,5 pontos percentuais sobre a Nova Democracia, o conservador partido que comandou a implantação da austeridade.

Mas só na hora do voto é que se saberá se os gregos, saturados pelo "austericídio", votarão de fato no Syriza, um partido que só nos últimos anos, anos de crise, entrou para a corrente principal da política.

Se o fizerem, o programa de Tsipras será testado ao limite, muito mais do que o foi o de Lula, que preferiu render-se à política convencional, depois da vitória, em vez de seguir as bandeiras históricas do PT.

A favor do Syriza joga o fato de que todo o rigor imposto à Grécia foi incapaz de resolver ou, ao menos, de atenuar o problema da dívida.

Ronda hoje os 175% do PIB, quando era de 129% em 2009, ano em que eclodiu a grande crise global.

Nesse mesmo período, a economia encolheu 25%, nível equiparável apenas ao de países em guerra.

Com esses números, as promessas de Tsipras soam até moderadas: programa de € 2 bilhões para os que vivem abaixo da linha de pobreza; aumento de aposentadorias e pensões; eletricidade grátis para 300 mil famílias, numa população de 11 milhões; remédios e tratamento médico gratuitos para desempregados -um programa que o velho PT assinaria embaixo.

Mas o problema é mesmo a ameaça de mexer com o pagamento da dívida, embora até nas academias do establishment haja vozes que admitem que pagá-la nas condições atuais é inviável.

"Sem alívio da dívida, a economia está destinada a permanecer deprimida", escreve, por exemplo, Philippe Legrain, pesquisador-visitante da London School of Economics. Legrain diz que, com a política atual, a economia só recuperará o nível pré-crise em 2030.

Vai se ver neste domingo se os gregos decidem acelerar os tempos ou se conformar.


Endereço da página: