Folha de S. Paulo


Republicanos, Cuba, Brasil

O principal problema para as relações Brasil/Estados Unidos, com o domínio republicano nas duas Casas do Congresso, não deve ser diretamente no plano bilateral.

Será em torno de Cuba.

Explico: em abril de 2015, realiza-se a 7ª Cúpula das Américas, a reunião de todos os países americanos, da qual Cuba está excluída.

Acontece que os países ditos bolivarianos já anunciaram, na cúpula anterior, que só participariam do encontro seguinte se Cuba fosse convidada, ao que os EUA se opõem.

Mas o anfitrião, o Panamá, já se antecipou e convidou formalmente a ilha caribenha.

Se os EUA insistirem no veto, criar-se-á o seguinte impasse: ou não irão os países latino-americanos ou não irá o presidente Barack Obama, expulso indiretamente de uma iniciativa originalmente norte-americana.

Onde entra o Brasil nessa história? Fácil: Dilma Rousseff apoia o convite a Cuba, o que significa que será coadjuvante de um "desconvite" a Obama exatamente em um momento em que, em tese, estará em curso o ensaio de reaproximação entre os dois governantes, após o episódio Edward Snowden.

É claro que essa situação existia antes da vitória republicana, mas fica ainda mais difícil, para Obama, depois dela.

Acontece que, no primeiro encontro que teve com Luiz Inácio Lula da Silva, Obama anunciou a intenção de eliminar o embargo a Cuba até o fim de seu mandato (que seria o primeiro). Foi com base nessa informação, aliás, que o governo Lula decidiu investir no porto cubano de Mariel, que só teria valor se fosse para exportar para os EUA, o que se tornaria possível –e um bom negócio– com o levantamento das sanções.

Obama não conseguiu (ou não quis) suspender o embargo, mas poderia ser tentado a fazê-lo agora que há menos resistência interna à iniciativa. Mas a vitória republicana, partido que trata o embargo como questão de honra, inviabiliza a hipótese.

Dificuldades com Cuba significam também dificuldades com os países ditos bolivarianos, ou seja, Venezuela, Equador, Bolívia e Nicarágua, todos eles fãs do regime castrista.

De novo, reflete nas relações com o Brasil, ao qual, de certa maneira, os EUA terceirizaram o acompanhamento da América do Sul.

Demonstra-o, se ainda fosse necessário, o fato de que é a Unasul, que não inclui os EUA, quem tenta fazer a mediação na Venezuela, em vez da Organização dos Estados Americanos, que inclui os EUA.

O normal é que os republicanos, com a nova maioria, façam pressão sobre a Venezuela, com a qual o Brasil mantém relações estreitas.

À parte questões políticas, há o lado comercial: os republicanos são, tradicionalmente, menos protecionistas do que os democratas.

Logo, ficará mais fácil aprovar no Congresso eventuais acordos de livre comércio que estão sendo negociados.

O Brasil, que já está isolado nessa matéria, ficará ainda mais marginalizado.

Com todas as complicações econômicas que Dilma tem pela frente, ruídos diplomáticos são perfeitamente dispensáveis.


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