Folha de S. Paulo


A barbárie se aproxima

Se você acha que a barbárie é uma hedionda característica apenas do Estado Islâmico e, portanto, está muito longe destes trópicos, pense de novo a partir das informações que seguem.

Autoridades mexicanas encontraram em fossas comuns nos arredores da cidade de Iguala (Estado de Guerrero, sul do país) os corpos "severamente queimados" de 28 pessoas.

Tudo leva a crer que os mortos são normalistas, como se chamam no México os candidatos ao professorado, aliás como se dizia antigamente no Brasil também (ao menos em São Paulo).

Quarenta e três deles foram sequestrados no mês passado, em uma operação conjunta da polícia municipal de Iguala e do grupo de narcotráfico autodenominado Guerreros Unidos.

Naquela região (como em algumas outras áreas do México), polícia e narcotraficantes são uma e a mesma coisa.

Prova-o o fato de que 30 policiais já foram identificados como integrantes da Guerreros Unidos, segundo o promotor Blanco.

Dois deles já confessaram que mataram 17 dos normalistas que o grupo havia sequestrado em setembro, levando os corpos para uma área de difícil acesso, chamada Pueblo Viejo, onde foram localizadas as fossas e os corpos carbonizados.

Os estudantes, de uma escola rural de tradição revolucionária, haviam tomados três ônibus, em negociação com os proprietários, como é hábito entre eles, para serem levados de volta de Iguala à escola em que são residentes.

Os três ônibus foram cercados e atacados pela coalização polícia/narcotráfico, em ação que deixou seis mortos, 25 feridos e os 43 desaparecidos, que, ao que tudo indica, foram incinerados em Pueblo Viejo.

O local fica a apenas 200 quilômetros da Cidade do México, o que demonstra como a barbárie é uma presença próxima e não apenas uma característica de áreas remotas do mundo ou do próprio México.

O Estado de Guerrero, de 3,5 milhões de habitantes, é o de mais elevada taxa de homicídios em um México ensanguentado há anos.

Se você se convenceu, até aqui, de que a barbárie está mais próxima do que imaginamos, pense de novo e volte os olhos para o Brasil.

Primeiro, México e Brasil estão empatados em número de homicídios por 100 mil habitantes (22 em cada um, o dobro do número que a Organização Mundial da Saúde considera que caracteriza epidemia).

Segundo, os incidentes ocorridos nos últimos dias em Santa Catarina, os frequentes problemas criados pelo crime organizado no Rio de Janeiro e em São Paulo e, mais recentemente, os ataques a policiais no domingo da eleição, dia 5, são claras indicações que a violência está escapando ou já escapou do controle das autoridades.

Quando bandidos, em vez de fugir da polícia, como seria de seu DNA, se animam a desafiá-la a luz do dia, como ocorreu na avenida 23 de Maio e no bairro de Campo Limpo, é porque a criminalidade se sente mais forte que o Estado.

Daí à barbárie é um pequeno passo.


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