Folha de S. Paulo


O conceito de uso misto e seus benefícios para a cidade

Estamos às vésperas de uma importante discussão em São Paulo: a nova lei de zoneamento. Ela vai definir onde e como se desenvolverão os mais diferentes usos e atividades no município. Dentro deste contexto, a adoção do conceito de uso misto na estruturação da disciplina do zoneamento pode ser uma ferramenta importante para equacionar a vida na cidade.

Definido como o empreendimento onde um edifício, ou um complexo de edifícios, apresenta mistura de usos e atividades, e costuma ter, por exemplo, núcleos residenciais combinados de forma inteligente com espaços comerciais, de escritórios, entretenimento, escolas e até mesmo serviços sociais ou de saúde.

Na atualidade, esse modelo tem sido debatido intensamente por planejadores urbanos, pois ele representa um método eficiente e compacto de utilização do solo, e que atenua, bastante, os deslocamentos na cidade, favorece a redução dos congestionamentos e diminui o consumo de energia com transporte. Além disso, empreendimentos desse tipo podem, em maior escala, ser utilizados para a criação de novos espaços de uso comum, principalmente se a legislação induzir corretamente a isso.

É possível estimular a implantação desse modelo de empreendimentos pela criação de zonas especiais de uso misto ou mesmo estabelecendo, na cidade, o chamado zoneamento em camadas, que podem ser superpostas a determinadas regiões do município.

Obviamente, se o objetivo é reduzir deslocamentos e diminuir o uso de transporte publico, é necessário que sejam planejados amplos e convidativos espaços para caminhada, além de uma rede de acessos para pedestres e ciclovias, que possa interligar diversos empreendimentos do mesmo tipo.

Uma das vantagens do uso misto verticalizado é, por exemplo, a possibilidade de se obter melhor aproveitamento do uso do solo, onde for desejável, quando um edifício de uso monofuncional poderia não ser viabilizado comercialmente.

Outras vantagens incluem, além da redução da dependência do automóvel e do uso de transporte público, a criação de espaços com identidade própria e senso de comunidade, com aumento da vitalidade econômica da região e incentivo a caminhadas e uso de bicicletas, além da possibilidade da implantação de diferentes produtos imobiliários, o que pode, certamente, mitigar riscos de investimento.

A implantação de empreendimentos de uso misto, principalmente em áreas mais centrais das cidades, ajuda não só a otimizar o uso do solo, mas também traz escala suficiente para que se possa construir com eficiência energética e adotar sistemas sustentáveis.

Esse tipo de diversificação urbana pode, além de tudo, manter um espaço vital da cidade ocupado 24 horas. As pessoas vão e vêm em diferentes horários para fazer coisas diferentes, o que pode, portanto, otimizar os níveis de utilização de espaços e equipamentos ou mesmo aliviar as curvas de demanda.

Por outro lado, os códigos de edificações devem ser revisados para acomodar essa tipologia mista. Nem sempre requisitos técnicos necessários para determinada atividade são importantes para outras que passarão a dividir os mesmos locais. Por exemplo, em edifícios de escritórios são necessários sistemas contra incêndio, diferentes daqueles eventualmente exigidos em edifícios residenciais.

Certamente, alguns tipos de usos não devem ser permitidos em determinadas regiões, pois uso misto não significa qualquer uso, em qualquer lugar. Um balanço perfeito entre eficiência e conforto é esperado nesse tipo de empreendimento, cujo equilíbrio adequado de usos pode significar o seu sucesso ou fracasso.


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