Folha de S. Paulo


A cada picada, penso: será que fui infectada?

O ano de 2015 marcará a história do Brasil por várias razões. Crise política, crise econômica, crise de valores. Na saúde, não só perdemos a guerra contra o mosquito Aedes aegypti como ele termina o ano ainda mais fortalecido.

Não bastasse a dengue que nos assombra há mais de três décadas, agora temos os vírus do zika e do chikungunya para tirar de vez o nosso sono. A cada picada de mosquito, penso: será que fui infectada dessa vez? E se fui, será dengue, zika ou chikungunya?

E se a sorte estiver do meu lado, tenho grandes chances de não apresentar sintoma algum. Os sinais da infecção por vírus zika, como febre baixa, conjuntivite e manchas pelo corpo, se manifestam em apenas 18% das pessoas. No caso da dengue, a cada dez pessoas picadas e infectadas, apenas duas vão desenvolver os sintomas. No chikungunya, a capacidade de infecção é menor ainda.

Mas se estiver entre os que desenvolvem sintomas, o que será pior? No zika, a febre é mais baixa do que na dengue e no chikungunya –nesse último, ela costuma ser abrupta e acima de 39°C. O pior do chiku são as terríveis dores articulares, que podem perdurar por anos. Na dengue, se tudo ocorrer bem, uma semana de cama e hidratação resolvem. Mas é preciso tomar cuidado para que não haja complicações hemorrágicas.

A infecção por zika representa um perigo maior para as grávidas por conta do risco de microcefalia. No meu caso, gravidez está fora de cogitação. Mas e a síndrome de Guillain-Barré, que já vitimou quase 600 pessoas no Nordeste neste ano?

Ela ocorre quando o sistema de defesa começa a atacar o próprio corpo, após enfrentar uma infecção causada por vírus ou bactéria. Em casos extremos, os músculos responsáveis pela respiração, como o diafragma, param de funcionar. Se o paciente não estiver no hospital, para ser prontamente entubado, pode morrer.

Pode parecer neura de repórter de saúde. Mas com tanto mosquito à solta, não há motivo algum para me sentir segura. Faço e conheço muita gente fazendo a lição de casa, eliminado os criadouros óbvios do mosquito.

Mas e aqueles que ninguém imagina que possam conter larvas do Aedes? Elas já foram encontradas em água acumulada em folhas de plantas, no telhado, em buracos de tijolos, em ralos, na gaveta de água do ar-condicionado, em buracos na calçada, em raízes expostas de plantas, em cacos de vidro colocados em muros. Enfim, em qualquer titico de água acumulada, lá estão elas, lá está o perigo.

E as campanhas educativas continuam focando nos pneus, nos vasinhos de plantas. Sim, eles são criadouros em potencial, mas há muitos outros que ninguém fala ou presta atenção.

Queria ter terminado a última coluna do ano com uma mensagem mais otimista. Não deu. Desculpa aí.


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