Folha de S. Paulo


O ministério de sempre

O ministério de Temer é o mesmo de sempre, o mesmo que foi de FHC, Lula e Dilma. Só saíram os quadros que derrotaram a hiperinflação nos anos 90 e os que reduziram a miséria nos anos 2000. Sobraram os ministros que sempre estiveram ali para garantir apoio parlamentar ao governo do dia.

A exceção é a área econômica, em que parece razoável esperar mais do novo governo. Henrique Meirelles teve uma atuação importante como presidente do Banco Central no governo Lula, em que pesem as críticas do atual chanceler.

Enquanto escrevo, há poucos nomes confirmados oficialmente para outros cargos, mas os candidatos mais cotados são economistas muito respeitados, que devem aceitar ir para o governo se a renegociação das dívidas dos Estados não for excepcionalmente camarada.

No começo da montagem do novo governo, falou-se em dramática redução do número de ministérios. Houve algumas fusões, mas boa parte da redução foi meio picareta: coisas que eram chamadas de ministério deixaram de ser.

E coisas muito mais importantes do que a maioria dos ministérios não terão esse nome: por exemplo, o ex-governador Moreira Franco, encarregado das concessões, não terá título de ministro, mas ninguém duvida de que terá muito poder.

Acabaram os ministérios de coisa de "comuna", como igualdade racial, direitos das mulheres e prevenção ao feudalismo, mas, sejamos honestos, é até bom que tenham acabado. Pelo padrão de montagem do governo, o mais provável é que todos fossem unificados em um só ministério e entregues a Paulinho da Força de vestido e "blackface".

Muitos reclamaram também da falta de mulheres e negros no ministério. Mas pode não ser preconceito: pode ser reflexo do fato de que mulheres e negros estão sub-representados entre os enrolados na Lava Jato, o grupo em que Temer recrutou mais ministros.

A composição do novo ministério diz muito sobre o que se pode esperar do novo governo. A aposta é em ajuste econômico e acomodação política. Esqueçam a propaganda de guerra dos defensores do impeachment: esse não é um governo de união nacional, não é refundação de nada, é um governo da classe política ameaçada pela Lava Jato tentando comprar legitimidade com a recuperação econômica.

Temer montou esse ministério para não cair como Dilma caiu. Entregou todos os cargos que Dilma não entregou (e os que entregou) para se blindar contra um novo impeachment e espera conseguir apoio da elite com o ajuste econômico (que Dilma também tentou fazer, com menos ambição e entusiasmo).

O PMDB tem muito mais inserção no sistema político do que o PT, muito mais, digamos, flexibilidade, e muito menos compromissos ideológicos. Tem mais chances de realizar as boas e as más tarefas em que o governo anterior falhou.

A montagem do ministério sugere, enfim, que o PMDB não acha que Dilma caiu porque o PT tinha muitos enrolados na Lava Jato (o ministério também os tem), mas por manobras partidárias e pela incapacidade de fazer o ajuste.

O PMDB deve saber do que está falando. Quem esperava um governo de grandes nomes leu errado o que está acontecendo. O que precisa ser explicado é por que tinham expectativa de que o novo governo fosse diferente. Não havia nos fatos nada que o sugerisse.


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