Folha de S. Paulo


Trabalho: o que conta além do salário

Por que você trabalha? É só para ganhar dinheiro ou você tem algum propósito por trás do que você faz? Você gosta do que faz? O que motiva você? Esse tipo de questão deixa muita gente acordada na calada da noite e mostra que existe muito por trás do universo aparentemente simples do trabalho.

A geração Y, por exemplo, é especializada nisto. Os trabalhos que mais interessam não são necessariamente aqueles que pagam melhor, mas sim os que dão autonomia, um senso de propósito e a flexibilidade que desejam ter para o seu dia-a-dia.

"Nossos empregos são uma parte integral de nossa identidade, e não apenas uma forma de ganhar dinheiro para termos um teto sobre nossas cabeças e manter a barriga cheia. Muita gente sente orgulho e encontra sentido em seus trabalhos", destaca Dan Ariely, autor de "Positivamente Irracional".

Segundo ele de o seu trabalho e esforço servir a algum propósito influencia diretamente a forma como o encaramos. Quer um exemplo? Pense naquele funcionário que virou a madrugada preparando uma apresentação que não foi usada, apesar de ter tido o esforço reconhecido pelo chefe. Ou então no escritor que foi pago por um livro que nunca saiu da gaveta do editor. Qual é o nível de felicidade e comprometimento que podemos esperar destas duas pessoas?

É baixo, mesmo que o trabalho não mude. Escrever um livro exige um bom esforço e, caso você goste da atividade, pode ser até algo prazeroso —mas todo o prazer acaba se você sabe que aquilo nunca será lido por ninguém. Logo, podemos perceber que a motivação não está no contracheque, mas sim na ideia de que o nosso trabalho pode ter algum sentido (seja fazer uma apresentação para o Conselho de Administração da sua empresa poder tomar uma decisão de compra de um concorrente ou desenvolver a cura do câncer).

Para provar essa hipótese, Ariely montou um estudo com alunos de engenharia de Harvard. Eles se inscreviam para serem pagos para montar Legos —uma atividade prazerosa por si só, especialmente para alunos de engenharia. Eles seriam pagos US$ 2 para o primeiro boneco que montassem, e ganhariam US$ 0,11 a menos por cada boneco extra, e todos sabiam que os bonecos seriam desmontados para o próximo participante.

A diferença era que o grupo de controle não via os bonecos serem desmontados, e o segundo grupo acompanhava a "destruição" do seu trabalho enquanto montava o próximo boneco (algo semelhante ao autor que escreve um livro que sabe que não vai ser publicado).

O resultado foi claro: os participantes do grupo de controle montaram, em média, 10,6 bonecos e receberam uma média de US$ 14,40, enquanto os do segundo grupo montaram apenas 7,2 bonecos e receberam US$ 11,52 na atividade. O mais interessante foi que 65% dos alunos do primeiro grupo continuaram a montar Legos depois de passarem a ganhar menos de um dólar, enquanto apenas 20% dos membros do segundo grupo fizeram o mesmo.

Depois da tarefa, eles eram questionados para avaliar se gostaram da atividade e quanto gostavam de Legos. Para os alunos do segundo grupo, não houve correlação entre o prazer da tarefa e a persistência nela.

Ou seja: ao acabar com o senso de sentido dos alunos do segundo grupo, que via o seu trabalho ser desmontado enquanto continuava nele, o estudo conseguiu eliminar qualquer tipo de motivação e prazer intrínseco que os participantes sentiam ao realizar uma tarefa que gostavam de fazer.

O estudo é interessante para você avaliar o seu próprio trabalho e as pessoas que trabalham próximas de você. São fatores simples que podem ter um impacto grande na sua motivação para realizar uma tarefa —além do fato de você gostar daquilo, pesa também a ideia de que aquele trabalho tenha algum sentido, ainda que seja apenas para o seu chefe.

Post em parceria com Carolina Ruhman Sandler, jornalista, fundadora do site Finanças Femininas e coautora do livro "Finanças femininas - Como organizar suas contas, aprender a investir e realizar seus sonhos" (Saraiva)


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